Blog I'unitá Brasil

Blog I'unitá Brasil
Blog I'unitá Brasil

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Do que não pode ser

  Por Afonso Hipólito

 

Tio D. e tia M. são casados há décadas e tem apenas um filho, J., que tem mais de 50 anos, é deficiente e totalmente dependente dos pais octogenários que sempre viveram para trabalhar e cuidar do filho.

Tio D. e tia M. são daquelas pessoas que por terem a vida lhe imposto adversidades extremas, aqueles que desconhecem o instinto dos guerreiros natos se perguntam: como eles não se cansam de trabalhar e amanhecem todos os dias como se tivessem sonhado com um dever na noite anterior e com a certeza de que terão força pra cumprir, e mais, como esta certeza parece nunca falhar, posto que o dever nunca dexa de ser cumprido ?

Tio D. e tia M. já tinham décadas derramando suor no solo de São Roque de Mutum na lida para plantar, cuidar e colher alimentos e amar o rebento J. da forma especial que ele precisa ser amado quando eu, que tenho trinta anos, nasci.

Tia M. tem, além do cansaço natural de uma vida longa de tanto trabalho, a fragilidade que o desenvolvimento contumaz, por anos, de doenças ósseas, causou.

Tio D. sempre foi um forte para tudo, mas como com o passar dos anos a força física se esvai, até mesmo dos que, como ele, parecem ter reserva infindável, também tem suas limitações.

Primo J., com o passar dos anos e as mudanças que ocorreram na forma de tratar eternas crianças puras como ele, se tranquiliza muito mais com o amor que recebe - e que sempre recebeu - dos pais do que com os comprimidos, que, presumo, nunca deixarão de lhe acompanhar, o que é de se entender, afinal estão juntos há tanto tempo.

Nos parcos passeios que meus queridos tios e meu primo fazem, saindo de manhã bem cedo e voltando ao anoitecer, às vezes eles vem almoçar na casa de minha amada mãe, irmã da tia M., e, claro, são e sempre serão recebidos com todo carinho, respeito e admiração que merecem.

Pena que os poucos passeios podem findar-se com a tristeza que, neste momento, enche a casa e os corações dos meus tios.

É que meus admiráveis tios e meu primo tiveram a casa em que vivem desde antes do meu primo nascer invadida por seres que, apesar das características observadas por meus tios, acredito que não são humanos.

Os seres invadiram a casa e de forma brutal humilharam e agrediram física e psicologicamente meus tios e meu primo, derramando álcool sobre eles e ameaçando atear fogo.

Como meus tios sempre tiveram uma forma peculiar de guardar o que conseguiam com o trabalho, os seres levaram tudo que todo o trabalho na terra lhes deu esses anos todos.