Por Thiago Alves Rodrigues
A outorga de um título de domínio de um imóvel a um cidadão carente de recursos financeiros, muito além de conferir segurança jurídica e promover a pacificação de conflitos fundiários, produz relevantes efeitos econômicos e sociais muitas vezes ignorados, ou mesmo subestimados, por todos nós.
De acordo com o economista peruano, Hernando de Soto, autor da instigante obra “O mistério do capital” (2001), a regularização dos ativos financeiros das pessoas pobres pode injetar no Terceiro Mundo uma quantia de dinheiro equivalente ao PIB dos Estados Unidos.
De fato, dentre os efeitos potenciais da simples transmutação do complexo fenômeno da posse em propriedade formal, podemos destacar: a) a concretização do direito fundamental à moradia, com a ampliação do acesso ao sistema financeiro de habitação e ao financiamento imobiliário de um modo geral; b) o acesso de micro e pequenos empresários, bem como de pequenos produtores rurais, a linhas de crédito bancário, públicas e privadas, com juros mais baixos, mediante a possibilidade de oferecimento de garantias reais; c) a valorização dos imóveis e de todo o entorno das áreas regularizadas; d) o estímulo à economia formal e a diminuição da pobreza, com a geração e circulação de riquezas; e) o desestímulo aos empréstimos financeiros concedidos à margem da legalidade (agiotagem); f) a possibilidade de um planejamento urbanístico mais eficiente por parte do município; i) maior eficiência na gestão e arrecadação de tributos por parte da administração pública.
Diante desse quadro, a Defensoria Pública Estadual tem motivos para se orgulhar de sua silenciosa contribuição para a progressiva transformação do quadro econômico e social dos municípios onde atua.
A título de exemplo, são mais de quatrocentas ações de usucapião em trâmite nas cinco Varas Cíveis da Comarca de Cachoeiro de Itapemirim, ajuizadas pelo órgão em favor de famílias hipossuficientes, tendo como objeto a declaração de domínio e o registro dos bens imóveis dessas pessoas, a maioria dos quais utilizados como moradia e com área inferior a 250m².
E, curiosamente, a experiência haurida dessa enxurrada de ações indica que vem crescendo por parte dos assistidos o interesse pelos efeitos periféricos da declaração de domínio, notadamente as oportunidades de acesso ao crédito bancário, fato que reflete o momento favorável por que passa a economia brasileira.
Mais crédito para comprar a casa própria, para reformar a residência ou para investir em pequenos empreendimentos significa mais dinheiro em circulação na economia local, mais empregos formais e uma espiral de desenvolvimento que, em última análise, é capaz de contribuir de maneira significativa com a redução da pobreza e das desigualdades sociais.
É por tais razões que hoje o defensor público, mais do que um advogado público, é visto como um verdadeiro agente de transformação social, pois sua atuação provoca reflexos mais abrangentes no meio social onde exerce o seu mister.
Nessa esteira, não seria exagero dizer que a atuação da Defensoria Pública, na atual conjuntura, contribui para a construção das bases jurídicas necessárias ao desenvolvimento do país, sobretudo quando sabemos que esse desenvolvimento tem como ator de destaque uma vasta classe social emergente, mas que ainda dependente de serviços públicos gratuitos oferecidos pela instituição.
Thiago Alves Rodrigues é Defensor Público no Estado do Espírito Santo