Por Ernesto Lopes
Em 2004,os herdeiros de Vinicius ede Moraes receberam R$ 256 mil pelos direitos autorais referentes às vendas de CD's e DVD's.Em 2007,a soma anual totalizou R$ 130 mil,uma redução de 51% na arrecadação.E,no ano passado,a família do compositor ganhou R$ 88 mil,quase um terço do valor registrado há sete anos.
Os números acima foram revelados por Georgina de Moraes,filha de Vinicius que divide com os irmãos a responsabilidade de zelar por mais de 300 músicase 400 poesias do artista.
A tarefa,por si só um grande desafio,torna-se cada dia mais difícil em tempos de crise na indústria do disco,duramente afetada pela pirataria e pelo download dec músicas na web.
Diante da queda vertiginosa nos repasses de direitos autorais,alguns sobrenomes de peso da MPB investem numa gestão empresarial do patrimônio herdado,como as famílias Moraes e Jobim.
Outros ainda brigam entre si pelo lucro obtido com as músicas,como é o caso de parentes de Raul Seixas,Tim Maia e Cartola.
Apesar de envolver discussão entre cinco herdeiros(Susana,Pedro,Georgina,Luciana e Maria),eles afirmam que nunca houve desentendimento grave nas decisões relacionadas ao legado do pai.
Os filhos optaram por criar a VM,em 1988.a empresa que negocia a obra do artista.As decisões são oficializadas por Georgina e a caçula Maria.
Vinicius morreu em 1980.No auge da venda de CD's,nos anos 90,o faturamento anual das gravadoras no País ultrapassava a marca de R$ 1 bilhão.Em 2000,passou a R$ 878 milhões.Na última pesquisa da Associação Brasileira de Produtores de Discos(ABPD),de 2009,as vendas somavam R$ 215 milhões.Em 10 anos,o comércio de CD's caiu de 93 milhões de unidades para 20 milhões.
Duzentos pedidos de autorização
No momento,a principal fonte de rendimentos para os herdeiros de Vinicius são os repasses do ECAD(Escritório Central de Arrecadação e Distribuição),que cobra pela execução de músicas transmitidas por rádios e TV's do País.
No ano de 2010,o valor chegou a R$ 376 mil.Mensalmente,os herdeiros recebem em torno de 200 pedidos de autorização para publicação de trechos da obra do compositor em livros,principalmente didáticos.Se a tiragem for pequena,eles não cobram pela concessão.
A VM diz ter sempre como primeiro impulso autorizar..Em vários casos,gratuitamente.Pela circulação da obra.
A rotina do escritório reúne alguns pedidos curiosos.Os publicitários,por exemplo,são atraídos,como que por instinto,pelos versos:"Era uma casa/Muito engraçada/Não tinha teto/Não tinha nada/Ninguém podia/Entrar nela não/Porque na casa/Não tinha chão."
A VM diz que os publicitários querem usar a música 'A Casa' em comerciais,mas mudando a letra.Normalmente,são propagandas de empresas de material de construção,diz Georgina,aos risos.Hoje,a resposta é sempre "não" para pedidos do gênero.
Parceria rende dor de cabeça
Na década de 60,Vinicius e Tom Jobim autorizaram o compositor americando Norman Gimbel a criar versões em inglês de alguns sucessos.A parceria rende dor de cabeça até ahoje.
Na divisão de direitos autorais no mercado internacional,Gimbel recebe até quando a música 'The girl from Ipanema' é executada na versão instrumental.O mesmo ocorre com outras canções adaptadas por ele para a lígua inglesa,como "Insensatez"("How insentive")e "Água de beber"("Drinking water").
Há cinco anos,os herdeiros de Vinicius e Tom entraram na justiça americana contra a Univarsal Publishing,braço editorial da gravadora,respónsável pelo contrato com Gimbel.
A VM já gastou US$ 260 mil com a ação nesse período.Estima-se que,no total,as duas famílias já desembolsaram mais de US$ 500 mil nesse imbróglio.
A VM considera um absurdo a falha no sistema de arrecadação que permite que Gimbel controle músicas dos dois autores brasileiros nos Estados Unidos.E diz que a questão não é dinheiro.É moral.Pois ele é só o versionista.Não é parte da criação original das músicas.E que isso é indissolúvel,e pertence aos autores originais.
Sufoco na ONG Viva Cazuza
No caso da obra de Cazuza,todos os direitos autorais são transferidos para a organização não-governamental administrada por sua mãe,Lucinha Araújo,que presta assistência a crianças portadoras do vírus HIV.
A Sociedade Viva Cazuza surgiu em 1990,após a morte do artista,sendo matida no início com a receita proveniente de suas músicas.A entidade vem sofrendo com a diminuição das verbas.
Segundo João Araújo,pai de Cazuza,ex-presidente da Som Livre e atual presidente de honra da ABPD,no começo as quantias arrecadadas pagavam com folgas os custos da Sociedade Viva Cazuza.Ms que recentemente já teve que botar dinheiro do próprio bolso para impedir o fechamento da ONG.
E se a arrecadação causa transtorno para herdeiros que convivem em harmonia,a situação piora quando estão em jogo disputas judiciais.
Carmelo,o filho de Tim Maia,assumiu a responsabilidade de administrar uma série de processos relacionados a dívidas deixadas pelo artista,que morreu em 1998.Ele também aguarda o desfecho da ação de investigação de paternidade proposta há dois anos por uma suposta filha de Tim.
Na família de Raul Seixas,a briga é entre sua viúva,Ângela Maria Affonso Costa,a Kika,e as duas primeiras filhas do artista:Simone Andrea O'Donoghue e Scarlet Vaquer Seixas.
A terceira herdeira éVivian,única filha de Raul com Kika.No processo,a viúva reinvidica uma participação maior na distribuição dos direitos autorais.
Para monitorar o uso do nome de Dorival Caymmi,um recurso usado por Danilo é a ferramenta do Google que rastreia tópicos relacionados a um determinado nome.
Danilo diz que,ainda assim,'tomou uma volta' em Salvador.'Um sujeito teria batizado um prédio por lá de Edifício Doravival Caymme'.Foi atrás,mas o construtor sumiu.
Na percepção de Danilo,há um senso-comum que avalia como algo errado remunerar um herdeiro pelos direitos autorais.O que considera absurdo.
Inspiração para os Caymmi
As gestões da Jobim Music e da VM serviram de inspiração para a Rosa Morena Edições Musicais,editora que responde pela obra de Dorival Caymmi.Após a morte do artista,em 2008,seus três filhos- os músicos Danilo,Nana e Dori - decidiram montar a empresa.Danilo se prontificou a assumir o comando,mas impôs uma condição.
Como a família tem o temperamento forte,Danilo só aceitou administrar com garantia de total autonomia nas decisões.
O assunto também desperta preocupação entre os Caymmi.No primeiro trimestre de 2011,eles receberam R$ 20 mil do ECAD pela execução pública das músicas do pai.Há cinco anos,o valor era três vezes maior.Pela venda de CD's,também nos primeiros três meses de 2001,a família ganhou menos de um salário mínimo da EMI(gravadora que comercializa 80% da obra de Caymmi).
Filho adotivo entra na justiça
O motorista Ronaldo Silva de Oliveira,60 anos,é filho adotivo do sambista Cartola e de Dona Zica.Ele processa na justiça Glória Regina,filha de Zica num relacionamento anterior a Cartola.
Em testamento,o compositor,que morreu em 1980,deixou a maior parte de seus bens,incluindo as músicas,para Dona Zica.A viúva,que morreu em 2003,repassou seu patrimônio para Glória Regina.
Ronaldo reivindica,no mínimo,62,5 % dos direitos autorais.Mas,por enquanto,ninguém recebe nada,toda a arrecadação é depositada em juízo.
Os dois lados dizem que ofereceram acordo de divisão igual e que não foi aceito.Muita contradição.
O filho de Cartola e a neta de Dona Zica,Nilcemar Nogueira,choram ao falar do assunto e dizem querer resolver tudo da melhor forma,'por respeito a memória de Cartola e Dona Zica',porém não chegam a um acordo.
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