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quinta-feira, 26 de março de 2015

O fotógrafo Sebastião Salgado fala de crise hídrica e denúncias de corrupção às vésperas do lançamento do documentário 'O Sal da Terra', que concorreu ao Oscar

por Pedro Castro




"Matamos os nossos rios e as nossas florestas, e não há partido ou político que vá resolver isso sozinho", atesta Sebastião Salgado. Para ele, o problema da crise hídrica brasileira é “de toda a sociedade. Todos somos seres políticos e temos responsabilidades sociais".

As ações do fotógrafo de 71 anos vão além do discurso afinado. Desde 1998, ele e sua esposa, Lélia Wanick, mantém o Instituto Terra, responsável pelo plantio de mais 2 milhões de árvores em Aimorés, no interior de Minas Gerais. De acordo com Salgado, a falta de água tem sido mais sentida agora, “mas esse problema já vem acontecendo há muito tempo. Se estivéssemos cuidando dos rios e das florestas, não estaríamos tão dependentes das chuvas para encher os reservatórios".

É este Sebastião Salgado engajado que o filme O Sal da Terra revela. Dirigido pelo alemão Wim Wenders e por Juliano Ribeiro Salgado, filho do casal, o filme concorreu ao Oscar na categoria documentário. Com lançamento no Brasil previsto para o dia 26, o longa vai além da obra do artista e mostra o agente social, o ambientalista. Para Lélia, o documentário "é mais do que um filme sobre a fotografia ou sobre a história de um homem, é um filme que mostra um ponto de vista sobre o mundo".

Ao falar para mais de mil pessoas no projeto Sempre um Papo, que leva escritores e artistas para conversarem com o público em Belo Horizonte, Sebastião Salgado arrancou aplausos. "A solução para a crise hídrica é simples: não medir esforços. O Brasil é um País incrível, mas parece que o brasileiro não percebe isso. Ainda somos muito pessimistas em relação à nossa própria gente”, alertou.

Salgado afirma que "hoje temos um Brasil moderno, mas que foi construído sobre as florestas e os rios". Por isso, devemos repensar o consumo. "Depois do segundo governo do PT, há um acesso de 40 milhões de pessoas à classe média. Isso nunca aconteceu e é positivo, mas gera demanda de água", explica. "A solução para o problema é preservar nossas nascentes. É absolutamente necessário que todas as instituições, sejam públicas ou privadas, façam sua parte."

É nesse sentido que o projeto Olhos d’Água pretende revitalizar todas as nascentes da bacia do Rio Doce, que tem o tamanho de Portugal. O fotógrafo contou ao público que a iniciativa do Instituto Terra "é um projeto que custa bilhões, mas, comparativamente, sai mais barato do que comprar aviões caça da Suécia".


Mesmo com a atual crise, Salgado mostra otimismo com o País. Em entrevista antes da palestra, ele afirmou que "pela primeira vez, os que estão no governo [federal] não são os mesmos que dominam os meios de comunicação, e por isso há informação sobre corrupção. Pela primeira vez, os corruptores estão pagando. Antes, só alguns intermediários eram acusados de corrupção. O Brasil já é um grande País e está cada vez mais sério".

Não é de hoje que Sebastião e Lélia estão ligado às causas sociais. "Depois de 64, participamos de todas as manifestações e ações de resistência à ditadura e estávamos determinados a defender nossos ideais. Isso era muito perigoso", conta.

Em agosto daquele ano, com pouco mais e 20 anos de idade, o casal se sentiu como as pessoas que ele viria a retratar anos mais tarde em Êxodos, que mostra aqueles que abandonam a terra natal.

Doutor em economia, Salgado conheceu Lélia enquanto fazia universidade em Vitória. "São 50 anos de sonhos realizados juntos", ela afirma sorridente. Um desses sonhos é o reflorestamento da fazenda herdada da família do fotógrafo que estava totalmente degradada e deu origem ao Instituto.

"Tinha acabado de lançar o Êxodos e estava profundamente deprimido, afundava no pessimismo. Vi coisas terríveis na África e na antiga Iugoslávia. Pensei então em um projeto para denunciar a destruição e a poluição das florestas", conta o fotógrafo. Foi nesse momento que Lélia surgiu com a ideia de replantar.

Mesmo com o inicio problemático (60% das mudas plantadas não "vingaram" no primeiro plantio), hoje o programa é um modelo para o País. Cerca de 700 projetos de educação ambiental que atingiram mais de 65 mil pessoas e o maior viveiro de plantas nativas de Minas Gerais são alguns exemplos da grandiosidade do projeto. "O Instituto é um de nossos filhos", afirma Lélia. "Plantar é como cuidar de uma criança, é preciso proteger, alimentar e dar condições para que, ao crescer, ela se torne independente", completa Salgado.

Foi neste momento de reaproximação com a natureza que o fotógrafo começou a pensar em fazer outro livro. "Foi vendo a vida nascer na floresta que surgiu o Gênesis", conta para o público. "Antes, eu havia fotografado apenas uma espécie: o homem. Para este projeto, precisei aprender a conviver com outras espécies".

Para ele, reaproximar da natureza é fundamental para compreendermos nosso lugar na Terra. "Hoje somos extraterrestres no nosso próprio planeta, não conhecemos nada sobre pássaros e plantas. Não temos a noção de que somos apenas uma espécie no meio de milhares. As árvores, por exemplo, são as responsáveis em manter a água no solo e o oxigênio no ar. Mas a cada dia cortamos mais árvores e poluímos mais a água e o ar. Temos que voltar em direção à Terra."

Mundo do Café

O fotógrafo não demonstra cansaço. Em maio ele inaugura a mostra Perfumes de Sonho – Uma Viagem ao Mundo do Café na Expo Universal de Milão 2015 e cinco dias depois leva o trabalho para Bienal de Veneza. "Resolvi fotografar a história das pessoas que trabalham com café. Tomar café é um coisa tão comum que não nos damos conta do tanto de gente envolvida no processo", explica Sebastião. Na mostra, ele registrou a relação do homem com o fruto na Etiópia, Guatemala, Índia, China, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Indonésia, Tanzânia e Brasil.


terça-feira, 17 de março de 2015

'Crise é forjada, mentirosa e induzida pela mídia', diz Leonardo Boff

Teólogo afirma que veículos de comunicação são golpistas e contra o povo, mas com os movimentos sociais emergiu uma nova consciência política, e o outro lado ficou sem condições de dar o golpe
São Paulo – A crise econômica e política pela qual o país atravessa neste momento é "em grande parte forjada, mentirosa, induzida, ela não corresponde aos fatos", afirma o teólogo Leonardo Boff. Segundo ele, a crise é amplificada por uma dramatização da mídia. "Essa dramatização que se faz aqui é feita pela mídia conservadora, golpista, que nunca respeitou um governo popular. Devemos dizer os nomes: é o jornal O Globo, a TV Globo, a Folha de S. Paulo, o Estadão, a perversa e mentirosa revista Veja."
Em entrevista à Rádio Brasil Atual na segunda-feira (9), o teólogo disse que, no entanto, o atual nível de acirramento no cenário político não preocupa porque, para ele, comparado a outros contextos históricos, a "democracia amadureceu". Ele diz acreditar, ainda, na emergência de uma "nova consciência política".
Boff também considera que o cenário brasileiro é bastante diferente da Grécia, Espanha e Portugal, onde são registradas centenas de suicídios, por conta do fechamento de pequenas empresas e do desemprego, e até mesmo de países centrais, como os Estados Unidos, que veem a desigualdade social avançar.
"A situação não é igual a 64, nem igual a 54", compara. "Agora, nós temos uma rede imensa de movimentos sociais organizados. A democracia ainda não é totalmente plena porque há muita injustiça e falta de representatividade, mas o outro lado não tem condições de dar um golpe."
Para Boff, não interessa aos militares uma nova empreitada golpista. Restaria ao campo conservador a "judicialização da política": "Tem que passar pelo parlamento e os movimentos sociais, seguramente, vão encher as ruas e vão querer manter esse governo que foi legitimamente eleito. Eles têm força de dobrar o Parlamento, dissuadir os golpistas e botá-los para correr".
Sobre o 'panelaço' ocorrido no domingo (8), durante o discurso da presidenta Dilma Rousseff para o Dia Internacional da Mulher, Boff afirma que o protesto é "totalmente desmoralizado", pois "é feito por aqueles que têm as panelas cheias e são contra um governo que faz políticas para encher as panelas vazias do povo pobre".
O teólogo afirma que a manifestação expressa "indignação e ódio contra os pobres" e são símbolo da "falta de solidariedade": "O panelaço veio exatamente dos mais ricos, daqueles que são mais beneficiados pelo sistema e que não toleram que haja uma diminuição da desigualdade e que gostariam que o povo ficasse lá embaixo".
Sobre o ato programado pela CUT e movimentos sociais para sexta-feira (13), Leonardo Boff diz que a importância é reafirmar os valores democráticos e a defesa da soberania do país: "Aqueles que perderam, as minorias que foram vencidas, cujo projeto neoliberal foi rejeitado pelo povo, até hoje, não aceitam a derrota. Eles que tenham a elegância e o respeito de aceitar o jogo democrático".
O teólogo frisa, mais uma vez, não temer o golpe. "É o golpe virtual, que eles fazem pelas redes sociais e pela mídia, inventando e fantasiando, projetando cenários dramáticos, que são projeções daqueles que estão frustrados e não aceitam a derrota do projeto que era antipovo."

Ouça a entrevista completa da Rádio Brasil Atual: AQUI

Fonte: AQUI



sexta-feira, 13 de março de 2015

PRISÃO DE BATTISTI É AFRONTA À SOBERANIA

"Prisão de Cesare Battisti durou poucas horas mas mostrou uma situação absurda: juiza de primeira instância mandou prender refugiado cuja presença no Brasil foi definida por um presidente da República", diz Paulo Moreira Leite, diretor do 247 em Brasília; "não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular", afirma; ele lembra, ainda, que o advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal, e que, entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello

por Paulo Moreira Leite


A prisão de Cesare Battisti desafiou uma decisão presidencial.

 “Será que o Brasil ficou de ponta cabeça e não me avisaram?”, perguntou um dos maiores juristas brasileiros, ao ser informado do fato.

 Preso na tarde de quinta-feira, Battisti foi solto no fim da noite do mesmo dia. Mas um episódio dessa natureza, envolvendo um personagem que em 2010 foi alvo de uma disputa política ácida entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Supremo Tribunal Federal e a oposição, merece alguns minutos de reflexão. Será que o Brasil se encontra de cabeça para baixo?

 Battisti encontra-se legalmente no Brasil por decisão de um presidente Republica.No último dia de seu governo, valendo-se de uma prerrogativa que a lei assegura ao presidente da República, Lula rejeitou o pedido de extradição do governo da Itália, onde Battisti havia sido condenado por quatro assassinatos ocorridos na década de 1970, no auge das organizações terroristas.

Parecia um caso resolvido, do ponto de vista político e jurídico até que, dias atrás, o Ministério Publico entrou com uma ação pedindo que Battisti fosse deportado. A juiza Adversi Rates, da 20a. Vara Federal de Brasília, acolheu o pedido, determinando a prisão até que fosse enviado para a Itália. No despacho, a juíza contestou diretamente a competência de um presidente da República para decidir o destino de Battisti. Escreveu que ele encontra-se em “situação irregular” no país. Como conta a repórter Natuza Nery, da Folha de S. Paulo, acrescentou que “por ser criminoso condenado em seu país de origem por crime doloso, não tem o direito de aqui permanecer, e portanto, não faz jus à obtenção nem de visto nem de permanência.” Lendo o despacho de Sua Excelência, conclui-se que a presença de Battisti não só era uma decisão complexa e polêmica, que dividiu opiniões em seu devido momento — mas ilegal.

Não tenho a menor condição de fazer uma crítica jurídica a essa afirmação. Mas há aspectos políticos óbvios. Cabe perguntar quem tem o direito — legal — de definir a permanência de qualquer pessoa — terrorista italiano, traficante colombiano, ditador sul-americano — no país. Não é uma questão secundária nem se pode dizer que o país nunca pensou a respeito.

 Em 2010, Lula só decidiu que Battisti iria permanecer no Brasil após uma decisão Supremo Tribunal Federal. Os ministros, em maioria, eram favoráveis à extradição de Battisti. Mas admitiram que a palavra final nessa matéria cabe ao Executivo. Foi apoiado nessa visão, da mais alta corte do país, que Lula decidiu a favor de Battisti. Não foi um gesto solitário, nem uma decisão irrefletida. Tampouco se pode imaginar que Lula tivesse cometido uma espécie de atropelo institucional com a decisão.

Na verdade, Lula tomou uma decisão coerente com a tradição democrática da diplomacia brasileira.

Até ditadores, como Alfredo Stroessner, do Paraguai, permaneceram no Brasil quando o país vizinho se democratizou — e sucessivos governos paraguaios se empenharam para que fosse extraditado. Trazido ao país de contrabando, o senador boliviano Roger Pinto só pode permanecer no Brasil nessas circunstâncias. Ele também é acusado de crimes horrendos em seu país de origem.

Apesar disso, a sentença de Adersi diz que ele deve ser deportado. Há diferenças entre extradição e deportação claro. Mas no fundo, estamos falando de responder a um pedido do governo da Italia, onde Battisti pode cumprir pena de prisão perpétua — que não existe no Brasil.

Graças a um recurso apresentando ao Tribunal, Battisti foi solto em poucas horas. A decisão lembrou o óbvio: não cabia a primeira instancia revogar uma decisão tomada em patamares superiores.

É curioso que tenha sido preciso lembrar uma verdade tão banal dos meios jurídicos. Até porque não estamos falando de um caso desconhecido.

O advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal. Entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello.

Mestre que se tornou nome de edifício na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo, Bandeira de Mello argumentou que Battisti foi julgado e condenado num ambiente que não lhe deu pleno direito de defesa. Um dos fatos notáveis do processo é que as principais acusações contra Battisti foram produzidas por antigos colegas da organização Proletários Armados do Comunismo sob um regime de delação premiada.

Em sua sentença, derrubada no Tribunal, a juíza Adersi respondeu a uma ação do Ministério Público, instituição que enfrenta um problema com o governo italiano. Até agora não conseguiu convencer as autoridades daquele país a lhe entregar um troféu político precioso: a extradição de Henrique Pizzolatto, condenado na Ação Penal 470, que fugiu para a Itália. Assim que Pizzolato foi localizado e preso na Italia, não faltaram comentários para lembrar que a permanecia de Battisti no Brasil poderia ser um obstáculo no pedido de extradição. É mais uma pergunta do caso: será razoável alterar uma decisão do governo brasileiro na esperança de se obter uma retribuição do governo italiano?

No mundo da Guerra Fria, a troca de prisioneiros — na verdade, espiões — era uma prática permanente do jogo político internacional. Berlim era o endereço predileto para esse tipo de evento, pelo menos nos filmes de espionagem. Levar essa hipótese a sério, no Brasil de 2015, implica em admitir que a Justiça pode ser manipulada para atender a finalidades políticas, o que é inaceitável.

Cada um pode especular a vontade. Mas não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular. “Será que o Brasil ficou de ponta cabeça?”

Cesare Battisti: entenda porque ele é considerado um refugiado político pelo Brasil

Cinco anos depois de o escritor e ativista Cesare Battisti ter obtido status de refugiado político após decisão do presidente Lula, a juíza federal de Brasília Adverci Rates Mendes de Abreu determinou nesta semana que ele seja deportado para a Itália.
Para entender o caso Battisti, é preciso compreender o período histórico em que ele atuou politicamente e o porquê das suas condenações.
Segundo advogada Marcela Moreira Lopez, diretora do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), a decisão deve ser revista. "O fato é que temos uma decisão de instância superior sobre o tema, e ela [a juíza] está se imiscuindo em uma decisão do presidente e do Supremo".
O caso do asilo político de Battisti gerou muita polêmica em 2010. Setores conservadores do Brasil e Itália, com auxílio dos meios de comunicação, não demoraram para taxá-lo de terrorista e assassino, sem ao menos conhecer sua história. 
Itália nos anos 70
A Itália dos anos 1970, época em que Battisti atuou politicamente, tinha grande efervescência política. Movimentos sociais, como o estudantil e o operário, reivindicavam direitos cíveis – entre os quais a legalização do divórcio e do aborto. 
Segundo o Doutor em História Social e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Giuseppe Cocco, “a Itália nesta época não era ‘de chumbo’, pelo contrário, os anos 70 foram uma época de conquistas sociais revolucionárias. Esses anos foram ‘chumbados’ porque o Estado organizou uma série de atentados para criar um clima de terror e reprimir os grupos de esquerda. Cocco explica que a luta armada, por parte da esquerda, respondia a essas provocações; foi uma década libertária dentro da qual ocorreram lutas armadas contra o fascismo”.
O professor lembra que essas lutas armadas ocorreram por conta do “compromisso histórico” firmado entre o Partido Comunista Italiano (PCI) e a Democracia Cristã (partido de direita com maioria no governo). De acordo com ele, isso fez com que o PCI deixasse de lado o seu caráter inovador e adotasse uma posição extremamente contrária aos movimentos sociais, que encararam esse compromisso como uma traição do partido.
Para o jornalista e organizador do Comitê de Solidariedade a Cesare Battisti, Celso Lungaretti, “a traição do PCI colocou os movimentos numa situação de desespero e excessos, levando-os a atitudes como o sequestro e assassinato [em 1978] do primeiro-ministro Aldo Moro pelas Brigadas Vermelhas [o principal grupo armado de extrema esquerda]”.
O assassinato de Moro, por sua vez, levou a uma forte repressão dos movimentos sociais, e, com a desculpa de “combater o terrorismo”, são criadas leis de exceção, que retiravam direitos da população e permitiam que se prendessem pessoas preventivamente por até dez anos e oito meses com base apenas em hipóteses e sem a necessidade de provas concretas; além de permitir tortura e legitimar a delação premiada.
Proletários Armados
Battisti conta sua história no livro “Minha fuga sem fim”. Ele conta que entrou para o grupo de resistência Proletários Armados para o Comunismo (PAC) em 1976, permanecendo nele até o final de 1978. 
O PAC, fundado pelo militante Pietro Mutti, nunca teve uma organização centralizada, de forma que qualquer pessoa ou grupo pudesse cometer atentados e atribuir a autoria dos delitos a este grupo. Após o sequestro e assassinato de Moro, o grupo decide abandonar a luta armada, adotando a máxima: “Sim à defesa armada, não aos atentados que acarretassem morte humana”.
Entretanto, a maneira estrutural do PAC fez com que essa filosofia não fosse realmente seguida, e atentados continuaram a ser realizados carregando o nome do grupo.
Battisti tenta convencer Mutti a dissolver o PAC. Sem sucesso, ele resolve, então, se desligar do grupo, vivendo clandestinamente na Itália.
“Juntamente com parte dos militantes da primeira hora, naquele momento decidi virar a página e renunciar definitivamente à luta armada. Não queríamos apenas deixar o grupo, queríamos também lhe dar um fim. Começaram, então, os problemas com meu antigo companheiro Pietro Mutti”, relatou Battisti.
Prisão
Ele é preso em 1979 e levado para uma penitenciária de segurança máxima, sob a acusação de “subversão contra a ordem do estado”. Após dois anos, seu processo foi revisto e ele transferido para uma prisão comum, onde conseguiu escapar graças à ajuda de Mutti. 
Sobre o tempo na cadeia, ele conta que “a cada dia prisioneiros desapareciam sem razão, para retornar após meses, embrutecidos e mudos, ou não retornavam. Tomei consciência de que as leis não seriam nunca normais para nós. Por causa disso, e apenas por isso, tomei a decisão de fugir”. E Battisti foge, então, para o México em 1982, mesmo ano em que Mutti foi preso pela polícia italiana.
Mutti, preso, denuncia diversos militantes e mesmo pessoas que não tinham ligação alguma com a luta armada, fazendo uso de uma das leis de emergência criadas: a “Lei dos Arrependidos”, que beneficiava presos políticos com redução de suas penas caso denunciassem pessoas que fizessem parte de grupos de resistência. Mutti foi um dos principais “arrependidos” do período, tendo sua prisão perpétua reduzida a nove anos. 
Entre as diversas denúncias feitas por ele, estão os quatro homicídios de que Battisti é acusado: em 6 de Junho de 1978, o assassinato de Antonio Santoro, em Undine; em 19 de Fevereiro de 1979, o duplo assassinato de Pierluigi Torregiani e Lino Sabbadin, em Milão e Mestre (cidades à aproximadamente 500 quilômetros de distância uma da outra), respectivamente; e em 19 de Abril de 1979, o assassinato de Andrea Campagna, em Milão. 
Somente após essas acusações, que não se baseiam em nenhuma prova concreta, Battisti é condenado à prisão perpétua e é visto, pelo Estado Italiano, como assassino.
Em 1990, Battisti vai à França, onde a Doutrina Mitterrand, criada pelo presidente François Mitterand, assegurava proteção política aos militantes que largaram as armas. Ele vive em Paris, trabalhando como zelador do prédio em que mora e também como escritor de livros policiais, que denunciavam a Itália repressora. 
A Itália pede que Battisti seja extraditado, e após catorze anos vivendo na França, ele é preso. Para tornar o processo de extradição legal, o presidente francês na época, Jacques Chirac, revê a Doutrina Mitterrand. Battisti é solto após três semanas, pois, em um primeiro momento, tanto a mídia francesa quanto a opinião pública estavam do seu lado e consideravam sua prisão como “uma afronta ao Estado de Direito Francês”.
Logo depois de ser solto, no entanto, a mídia francesa muda completamente sua opinião em relação ao caso. Battisti se torna um “monstro” que deveria pagar pelo que fez. O tribunal francês decide então por sua extradição, e ele foge para o Brasil. Se Battisti fosse extraditado, ele seria preso apenas pelas acusações de Mutti. 
Ele não teve direito a um julgamento justo, no qual pudesse se defender de maneira legítima, mostrando sua versão dos fatos. 
Como afirma o filósofo francês Bernard-Henri Lévy, no prefácio da autobiografia de Battisti, “defendo tão-somente um processo imparcial, desapaixonado, conforme aos princípios do direito europeu e do bom senso – defendo, e este é o sentido deste prefácio, que se assegure a Cesare Battisti o direito de confrontar, pessoalmente, o seu passado e o seu destino”.
Briga diplomática
Além da polêmica interna, o caso Battisti abalou relações diplomáticas entre Brasil e Itália, uma vez que a decisão brasileira não foi respeitada pelas autoridades italianas, que ameaçaram até cancelar um jogo amistoso entre as seleções de futebol dos dois países. 
O deputado italiano Ettore Pirovano, do partido de direita Liga Norte, declarou ironicamente que “não me parece que o Brasil seja conhecido por seus juristas, mas sim por suas dançarinas. Portanto, antes de pretender nos dar lições de Direito, o ministro da Justiça faria bem se pensasse nisso não uma, mas mil vezes”. 
Lungaretti, do Comitê de Solidariedade a Cesare Battisti, diz não se surpreender com essa posição da Itália. “Sempre teve essa visão arrogante do mundo. Reconhecem as grandes potências, mas o resto é periferia. Tanto que há realmente essa visão preconceituosa sobre o Terceiro Mundo”, afirma.
A pergunta que Battisti faz a todo o momento em seu livro é “por que eu”? Não se sabe ao certo os motivos que a Itália tem para exigir sua extradição a ponto de abalar as relações com o Brasil. Para Lungaretti, “a Itália não fez as pazes com seu passado, e Battisti representa esse passado. Ele é um homem perseguido por suas ideias”.
E, mesmo após receber asilo político do governo brasileiro, esta perseguição continua. 

quinta-feira, 12 de março de 2015

Cuide da sua consciência para que o mal não alcance seu objetivo: um reino dividido entre alienados e loucos.

por Afonso Hipólito



Ontem discuti com um de meus irmãos, perdi o equilíbrio e o ofendi.

Minha reação foi consequência de um misto de tristeza e revolta. Tristeza por ver que uma pessoa tão próxima e que tanta importância tem no fato de eu gostar de ler ter se tornado um alienado guiado pela estupidez, e revolta por eu não ter percebido que a doença que tem acometido milhões de pessoas e contra qual luto diariamente, a alienação intelectual, lhe tivesse infectando e hoje esteja num estágio de metástase como o que é: uma espécie de câncer.

Logo após a discussão minha consciência foi tomada por uma dor- como se física fosse- como se eu, humanista que sou, tivesse dado um soco na face de uma criança com síndrome de asperger ou de um idoso em avançado estado no mal de alzheimer por conta de algo cometido por corpo no sono da mente. Ou seja, minha consciência, que eu julgo sã, deu-me um sinal de que pode adoecer se dela eu não cuidar.

Cuidarei de minha consciência lutando com palavras e ações de bem com todas as minhas forças para não ferir ninguém, principalmente estes pobres doentes, cada dia em número maior de infectados pela maldade e guiados pela estupidez.  



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quarta-feira, 11 de março de 2015

PAI E FILHO RECEBERAM MAIS DE UM MILHÃO DE EMPRESAS DA LAVA JATO

Na Paraíba, pai e filho receberam mais de um milhão em doação de empresas da Lava Jato

Mais de R$ 1 milhão de reais. Esse foi o montante doado por empresas investigadas na Operação Lava Jato, da Polícia Federal, para campanha eleitoral de dois expoentes do “tucanato” no Estado da Paraíba.

Os contemplados foram o deputado federal mais votado no Estado, Pedro Cunha Lima (PSDB) e seu pai, o senador Cássio Cunha Lima (PSDB), que em 2014, disputou o cargo de governador, mas acabou sendo derrotado no 2º turno pelo candidato à reeleição, Ricardo Coutinho (PSB).

Campeão de votos, Pedro, que disputou seu primeiro mandato e, até então, fora o parentesco, era um anônimo na política, recebeu da empresa Odebrech a singela doação de R$ 12.850 durante a campanha eleitoral de 2014.

Seu pai, o senador Cássio, por sua vez, foi melhor prestigiado e emplacou a bagatela de R$ 1 milhão, doados por outras três empresas, também investigadas pela Operação Lava Jato.

O senador paraibano tucano recebeu R$ 500 mil da Queiroz Galvao; R$ 300 mil da OAS e R$ 200 mil da Andrade Gutierres, totalizando R$ 1 milhão.

Todas as empresas citadas como doadoras foram denunciadas pelo doleiro Alberto Yousseff, acusado de ser o operador do esquema que pagava propina a políticos e a partidos políticos.

Apesar do recebimento, até agora, apenas dois paraibanos foram citados oficialmente na lista dos suspeitos de envolvimento no esquema, são eles: Lindebergh Farias (PT) e Aguinaldo Ribeiro (PP). Os nomes da lista estão ligados a pedidos de investigação feita pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, com base em informações da delação premiada do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto da Costa.

Aguinaldo Ribeiro, no entanto, demonstrou tranquilidade, informou que o processo que inclui o seu nome foi mandado arquivar, assim como os que citavam os senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Ciro Nogueira (PP-PI) e Romero Jucá (PMDB-RR) e defendeu a investigação para o caso.

“O processo específico que cita o meu nome foi mandado arquivar pelo Ministério Público Federal por absoluta falta de elementos enquanto que a outra parte que não foi arquivada eu não tenho conhecimento sobre o caso e irei aguardar o momento oportuno para me pronunciar, só adianto que em 2010 eu era deputado estadual e nem era conhecido nacionalmente. Todavia, prefiro aguardar o teor do inquérito, não tenho nada a temer e acima de tudo defendo a investigação de todas as denúncias” declarou.

ENTENDA 

Operação Lava Jato


A Operação Lava Jato, deflagrada pela Polícia Federal (PF) em 17 de março de 2014, desmontou um esquema de lavagem de dinheiro e de evasão de divisas que movimentou algumas centenas de milhões de reais. As investigações indicam a existência de um grupo brasileiro especializado no mercado ilegal de câmbio. No centro das investigações, estão funcionários do primeiro escalão da Petrobras, a maior empresa estatal do Brasil. A PF apontou o pagamento de propina envolvendo executivos de empresas, especialmente empreiteiras, que assinaram contratos com a companhia de petróleo e políticos. Entre os crimes cometidos, aponta a investigação, estão sonegação fiscal, movimentação ilegal de dinheiro, evasão de divisas, desvio de recursos públicos e corrupção de agentes públicos.

A queda das empreiteiras

Em novembro, a Operação Lava Jato entrou em uma nova fase. Desta vez, por determinação da Justiça Federal, foram presos alguns presidentes e diretores das maiores empreiteiras do País, como Camargo Corrêa, OAS, Odebrecht, Mendes Junior, Engevix, Engesa, UTC e Queiroz Galvão e Iesa. Os especialistas em Justiça relacionaram a Operação Lava Jato a Operação Mãos Limpas, da Itália. Nos anos de 1990, o trabalho da Justiça italiana ajudou a acabar com vários esquemas envolvendo o pagamento de propina por empresas privadas que tinham interesse em garantir contratos com órgãos públicos e estatais com o objetivo desviar recursos para o financiamento de campanhas políticas.

O caminho do dinheiro

De acordo com as investigações da PF, existe uma suposta ligação entre o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa com o esquema de lavagem de dinheiro operado pelo doleiro Alberto Yousseff. Costa foi preso pela Polícia Federal em 20 de março enquanto destruía documentos poderiam ter relação com o inquérito. Em depoimento à Justiça Federal, em outubro, Costa revelou o pagamento de propina na Petrobras. Segundo o ex-executivo da companhia, o dinheiro era cobrado de fornecedores da estatal e redirecionada a três partidos: PT, PMDB e PP. As legendas teriam utilizado o dinheiro na campanha de 2010. Os partidos negam que isso tenha ocorrido. Em outubro, como decidiu colaborar com as investigação, Costa conseguiu um acordo de delação premiada homologado pela Justiça. Este tipo de acerto pode ajudar na redução de sua pena em caso de condenação pela Justiça. O mesmo tipo de acordo é negociado pelos advogados de Alberto Youssef, que tem dado uma série de depoimentos à Justiça Federal e contribuído com informações sobre os envolvidos no esquema dentro de partidos.

Os políticos

Na noite de sexta-feira, 6 de março, a lista elaborada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com os nomes de 47 políticos supostamente envolvidos em desvios na Petrobras foi divulgada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki. No mesmo dia, foram abertos 28 inquéritos para investigar os acusados, 37 deles suspeitos de formação de quadrilha. Entre os nomes da lista estão o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (PMDB-AL); o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ); o senador Fernando Collor de Melo (PTB-AL), ex-presidente da República; e o senador Antônio Anastasia (PSDB-MG), ex-governador de Minas Gerais. O Partido Progressista (PP) é o maior alvo de inquéritos, 32 no total. O senador Aécio Neves (PSDB-MG) chegou a ser incluído na lista, mas teve seu inquérito arquivado devido à fragilidade de provas contra ele. No dia seguinte à divulgação dos nomes, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, concedeu entrevista coletiva na qual defendeu a presidente Dilma Rousseff, afirmando que ela não foi inclusa na lista por não haver provas para isso e afirmou por diversas vezes que o governo federal não interferiu de nenhuma forma na investigação, ressaltando a independência das instituições no País em relação à presidência da República.

O início dos trabalhos

Na primeira fase da Operação Lava Jato, os mandados de prisão e de busca e apreensão relativos a Operação Lava Jato foram expedidos em Curitiba e outras 16 cidades do Paraná. Os agentes federais também cumpriram ordens judiciais em outros seis Estados: São Paulo, Distrito Federal, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Mato Grosso. Na fase da operação deflagrada em novembro, houve mandados de prisão, busca e apreensão e ações coercitivas em cinco Estados (Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco), mais o Distrito Federal. 



Fonte: AQUI

domingo, 8 de março de 2015

Quem tem medo do Lula??

Lula é odiado porque deveria ter dado errado e deixado as elites para seguirem governando o Brasil. Odeiam nele o pobre, o nordestino, o trabalhador.


por Emir Sader 







Emir Sader



A direita – midiática, empresarial, partidária, religiosa – entra em pânico quando imagina que o Lula possa ser o candidato mais forte para voltar a ser presidente em 2018. Depois de ter deixado escapar a possibilidade de vencer em 2014, com uma campanha que trata de colocar o máximo de obstáculos para o governo de Dilma – em que o apelo a golpe e impeachment faz parte do desgaste –, as baterias se voltam sobre o Lula.

De que adiantaria ajudar a condenar a Dilma a um governo sofrível, se a imagem do Lula só aumenta com isso? Como, para além das denuncias falsas difundidas até agora, tratar de desgastar a imagem de Lula? Como, se a imagem dele está identificada com todas as melhorias na vida da massa da população? Como se a projeção positiva da imagem do Brasil no mundo está associada à imagem de Lula? Como se a elevação da auto estima dos brasileiros tem a ver diretamente com a imagem de Lula?

Mas, quem tem tanto medo do Lula? Por que o ódio ao Lula? Por que esse medo? Por que esse ódio? Quem tem medo do Lula e quem tem esperanças nele? Só analisando o que ele representou e representa hoje no Brasil para entendermos porque tantos adoram o Lula e alguns lhe têm tanto ódio.

Lula deu por terminados os governos das elites que, pelo poder das armas, da mídia, do dinheiro, governavam o pais só em função dos seus interesses, para uma minoria. Derrotou o candidato da continuidade do FHC e começou uma serie de governos que melhoraram, pela primeira vez, de forma substancial, a situação da massa do povo brasileiro.

Quem se sentiu afetado e passou a odiar o Lula? As elites politicas que se revezavam no governo do Brasil há séculos. Os que sentiram duramente a comparação entre a formas deles de governar e a de Lula. Sentiram que o Brasil e o mundo se deram conta de que a forma de Lula de governar é a forma de terminar com a fome, com a miséria, com a desigualdade, com a pobreza, com exclusão social. Eles sofrem ao se dar conta que governar para todos, privilegiando os que sempre haviam sido postergados, é a forma democrática de governar. Que Lula ganhou apoio e legitimidade, no Brasil, na América Latina e no mundo justamente por essa forma de governar.

Lula demonstrou, como ele disse, que é possível governar sem almoçar e jantar todas as semanas com os donos da mídia. Ele terminou seu segundo mandato com mais de 80% de referências negativas na mídia e com mais de 90% de apoio. Isso dói muito nos que acham que controlam a opinião publica e o pais por serem proprietários dos meios de comunicação.

Lula demonstrou que é possível – e até indispensável – fazer crescer o pais e distribuir renda ao mesmo tempo. Que uma coisa tem a ver intrinsecamente com a outra. Que, como ele costuma dizer, “O povo não é problema, é solução”. Dinheiro nas mãos dos pobres não vai pra especulação financeira, vai pro consumo, para elevar seu nível de vida, gerando empregos, salários, tributação.

Lula mostrou, na pratica, que o Brasil pode melhorar, pode diminuir suas desigualdades, pode dar certo, pode se projetar positivamente no mundo, se avançar na superação das desigualdades – a herança mais dura que as elites deixaram para seu governo. Para isso precisa valorizar seu potencial, seu povo, elevar sua auto estima, deixar de falar mal do país e de elogiar tudo o que está lá fora, especialmente no centro do capitalismo.

Lula fez o Brasil ter uma política internacional de soberania e de solidariedade, que defende nossos interesses e privilegia a relação solidaria com os outros países da America Latina, da África e da Ásia.

Lula foi quem resgatou a dignidade do povo brasileiro, de suas camadas mais pobres, em particular do nordeste brasileiro. Reconheceu seus direitos, desenvolveu politicas que favoreceram suas condições de vida e uma recuperação espetacular da economia, das condições sociais e do sistema educacional do nordeste.

Lula é odiado porque deveria dar errado e deixar em paz as elites para seguirem governando o Brasil por muito tempo. Um ódio de classe porque ele é nordestino, de origem pobre, operário metalúrgico, de esquerda, líder máximo do PT, que deu mais certo do que qualquer outro como presidente do Brasil. Odeiam nele o pobre, o nordestino, o trabalhador, o esquerdista. Odeiam nele a empatia que ele tem com o povo, sua facilidade de comunicação com o povo, a popularidade insuperável que o Lula tem no Brasil. O prestígio que nenhum outro político brasileiro teve no mundo.

A melhor resposta ao ódio ao Lula é sua consagração e consolidação como o maior líder popular da  historia do Brasil. A força moral das suas palavras – que sempre tentam censurar. Sua trajetória de vida, que por si só é um exemplo concreto de como se pode superar as mais difíceis condições e se tornar um líder nacional e mundial, se se adere a valores sociais, políticos e morais democráticos.

Quem odeia o Lula, odeia o povo brasileiro, odeia o Brasil, odeia a democracia.

O Lula é a maior garantia da democracia no Brasil, porque sua vida é um exemplo de prática democrática. O amor do povo ao Lula é a melhor resposta ao ódio que as elites têm por ele. 

Corruptos: No centro do poder há décadas


por Jornal do Brasil

   Na lista divulgada nesta sexta-feira (06/03) pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot, salta aos olhos a quantidade de parlamentares do PP. O Partido Progressista tem nada menos que 31 políticos de um total de 49 nomes nessa relação enviada ao STF. São 29 deputados (sendo que 18 estão atualmente exercendo seus cargos) e 3 senadores de um total de 12.
Aqui cabe um exercício de história. Para começar: quem é o Partido Progressista? O PP nasceu de uma costela do PDS, que sucedeu a Arena, o partido que governou depois do golpe de 1964. É o partido que abriga Paulo Maluf e Jair Bolsonaro, além de outros conhecidos parlamentares ligados ao golpe. Ou seja, é um partido que conhece a fundo a Petrobras há 50 anos.

O segundo partido com maior presença na lista é o PMDB, que comandou a Petrobras durante todo o governo Sarney (1985-1990), sucedendo a ditadura. Edison Lobão, ex-ministro de Minas e Energia, está na lista.

Nos anos 70 no Maranhão, em plena ditadura, Lobão era um jornalista por quem o então presidente Ernesto Geisel nutria grande simpatia. Consta que Geisel teria pedido ao influente senador da época, Victorino Freire, que Lobão fosse transformado numa grande liderança no Maranhão.

Outra presença significativa na chamada "lista de Janot" vem do PTB (Partido trabalhista Brasileiro): o senador Fernando Collor de Mello, ligado ao seu ex-secretário de assuntos estratégicos do Departamento de Inteligência Pedro Paulo Leoni. O ex-presidente da República teve o apoio de todos os partidos da elite brasileira nas eleições de 1989.

A lista de Janot ainda tem um segmento do PT, partido odiado, como disse o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira em recente entrevista à Folha de S. Paulo, por todos os outros grandes partidos que representam a maioria do Congresso.
Outro nome na lista é o do senador Antonio Anastasia (PSDB), ex-governador de Minas e cria de Aécio Neves. O delator, o policial federal Jayme Alves de Oliveira Filho, conhecido como "Careca", revelou à PF que teria levado R$ 1 milhão a uma casa em Belo Horizonte sem saber a identidade do destinatário. Ele diz ter entregue nas mãos de Anastasia e afirma ter reconhecido o político posteriormente, através de fotos. Então esse dinheiro não era para o político mineiro?

A lista de Janot tem 49 políticos. Fica a questão: e os grandes corruptores do Brasil? Onde estão aqueles grupos de sempre, que operam nas sombras há décadas. São os donos de concessões de estradas, de aeroportos, empresas de comunicações, empresas de energia, bancos. Eles representam cerca de 70% do empresariado brasileiro.

E alguns envolvidos na Operação Lava Jato querem agora criar uma CPI contra o Ministério Público para fazer com ele o mesmo que foi feito com um magistrado no Rio de Janeiro. Por uma conduta irresponsável, o juiz foi transformado em delinquente e o empresário corrupto em santo.

Será que o erro do juiz deve ofuscar os crimes de manipulação de mercado e uso de informação privilegiada praticados pelo empresário, que acabaram lesando em até R$ 7 bilhões o BNDES e comprometeram obras importantes para o Rio?

O mesmo não pode acontecer em Brasília. As investigações devem seguir, sem pressões políticas ou econômicas para que tenhamos um julgamento baseado nas leis e nas garantias constitucionais. Mas é importante saber separar o joio do trigo e identificar quais são os grupos mais poderosos que saqueiam o dinheiro do povo brasileiro há décadas.

quarta-feira, 4 de março de 2015

"Imposto sobre grandes fortunas renderia 100 bilhões por ano"

Especialista estima que a taxação de patrimônios acima de um milhão de reais poderia render um valor equivalente ao da extinta CPMF




por Renan Truffi


Único dos sete tributos federais previstos nas Constituição sem regulamentação até hoje, o imposto sobre grandes fortunas pode sair do papel em um momento no qual o governo federal busca ampliar sua arrecadação. Vista como alternativa à esquerda, após um ajuste fiscal iniciado pela retirada de direitos trabalhistas, a proposta voltou à tona com o sucesso do livro do economista francês Thomas Piketty, O Capital No Século XXI, para quem não discutir impostos sobre riqueza é loucura.

Mestre em Finanças Públicas e ex-secretário de Finanças na gestão da prefeita Luiza Erundina em São Paulo, Amir Khair é especialista no assunto. Em entrevista a CartaCapital, Khair calcula que a taxação de patrimônios poderia render aproximadamente 100 bilhões de reais por ano se aplicada, em uma simulação hipotética, sobre valores superiores um milhão de reais. “Quando você tem uma sociedade com má distribuição de riqueza, você tem uma atividade econômica mais frágil. O imposto sobre grandes fortunas (...) teria uma arrecadação semelhante àquela que tinha a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira). Portanto bem acima até do ajuste fiscal pretendido pelo governo”, afirma.

CartaCapital: O livro de Thomas Piketty trouxe, mais uma vez, a discussão do imposto sobre grandes fortunas. Por que o senhor acha que essa proposta ainda é vista como uma pauta de esquerda, sendo que está prevista na Constituição?

Amir Khair: Pergunta interessante essa. Por que está na Constituição e é uma pauta de esquerda? Talvez a Constituição represente uma regra de convívio social na qual a população de menor renda tenha um pouco mais de acesso aos bens de democracia. A democracia prevê um regime de maior equilíbrio social. Prevê um regime do governo para o povo, de interesse do povo. Quando você estabelece na Constituição um imposto sobre grandes fortunas, que no fundo, independente do nome, é um imposto que visa alcançar riqueza, você está contribuindo para uma melhor distribuição dela entre a população. Esse foi o objetivo dos constituintes em 1988. O que não se esperava é que o próprio Congresso que aprovou isso seja o Congresso a não aprovar a regulamentação desse tributo. E a razão é muito simples. Por que o Congresso não aprova? Porque os congressistas quase sem exceção seriam atingidos por essa tributação. Quando eles são atingidos, eles não aprovam nenhuma mudança tributária que os atinja. Essa é a razão central pelo fato de, ao longo de todos esses anos, não ter sido regulamento o imposto.

CC: O imposto sobre grandes fortunas é o único dos sete tributos previstos na Constituição que ainda não foi implementado. Então não é só a influência dos mais ricos, mas o fato do Congresso ser também uma representação da camada mais rica da população?

AK: É uma visão curto-prazista, no sentido que você estaria defendendo o interesse dos mais ricos, mas na essência você estaria prejudicando até a essência dos mais ricos. Quando você tem uma sociedade com má distribuição de riqueza, você tem uma atividade econômica mais frágil. Eu não tenho o consumo usufruindo no potencial que ele tem. Quando você tem o consumo usufruindo o potencial que ele tem, você tem mais produção, mais riqueza de uma forma geral e é claro que os mais ricos se apossam melhor dessa riqueza gerada. Quando você tem má distribuição de riqueza ou de renda, você tem uma atividade econômica mais restrita e consequentemente menos faturamento nas empresas, menos lucro.

CC: Nesse início de segundo mandato, o governo Dilma optou por fazer um reajuste fiscal e reviu o acesso a alguns direitos dos trabalhadores, como o seguro-desemprego. Mas agora cogita a possibilidade de regulamentar o imposto sobre a riqueza. Na opinião do senhor, o imposto sobre grandes fortunas poderia ter o mesmo peso, ou até um impacto melhor, para o ajuste das contas do governo, sem que fosse necessário mexer nos direitos trabalhistas? 
AK: Se aplicado com uma alíquota média de 1% sobre aquilo que são os bens das pessoas, teria uma arrecadação semelhante àquela que tinha a CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), que foi extinta. E tem, portanto, um poder arrecadador forte. Hoje eu estimo em cerca de 100 bilhões de reais/ano. Portanto bem acima até do ajuste fiscal pretendido pelo governo.
CC: Portanto, seria uma alternativa a todas essas medidas que o governo vem tomando desde o início do segundo mandato e que desagradaram trabalhadores e movimentos sociais? 
AK: Sim, eu acho que seria uma medida desenvolvimentista em essência porque não atinge aquilo que é essencial aos trabalhadores, portanto aquilo que se traduz efetivamente em consumo. Quando você corta direitos dos trabalhadores você corta consumo automaticamente. Cortando consumo, você corta faturamento e o lucro delas. Então você paralisa o País também ao fazer isso. Essas medidas que o governo está adotando, independente do fato que você tem que ter rigor fiscal, e rigor fiscal não se toma com essas medidas do governo, estão muito aquém do rigor fiscal necessário ao País. Essas medidas travam o crescimento. Ao travar o crescimento, cai a arrecadação pública. Ao cair a arrecadação pública, o objetivo do governo de atingir sua meta não será atingido.

CC: Quais as consequências e como o senhor avalia a postura do governo de fazer corte nesses benefícios trabalhistas? 
AK: É uma atitude um pouco simplista, uma atitude que não resolve. Como eu falei, quando você corta na base da pirâmide social você diminui consumo e, portanto, diminui a própria arrecadação pública. Então uma coisa anula a outra, ou até pior do que anula. Pode acontecer como aconteceu no passado. Você tem um déficit muito maior das contas públicas e não resolve. O governo teria uma alternativa muito mais eficaz, muito mais forte, muito mais rápida, muito mais factível, caso reduzisse as despesas com juros. Os juros no ano passado corresponderam a 6% do PIB [Produto Interno Bruto] e isso gerou um rombo nas contas públicas. Quer dizer, o que deu um rombo nas contas públicas foram os juros. E o Brasil é um dos campeões mundiais de juros. O Brasil tem sempre sobre a questão fiscal um ônus de 6% do PIB, quando no mundo todo gira em torno de 1%. Então quando você tem uma conta anormal por consequência dos juros, a providência mais normal, óbvia, é você atacar essa questão. Essa é a questão central e é fácil de atacar. Como você ataca? Reduzindo a Selic [taxa básica de juros]. A Selic está muito acima do padrão internacional, o padrão internacional das taxas básicas de juros é a inflação do País. Nós estamos com seis pontos acima da inflação na Selic. Quando você reduzir isso para a inflação do País, essa conta de juros cai rapidamente e, ao cair rapidamente, você faz um ajuste fiscal sério, para valer. Muito diferente do que o governo está propondo.

CC: Segundo Piketty, o imposto sobre grandes fortunas poderia ser atrelado à diminuição da carga tributária sobre o consumo. Como o senhor enxerga essa proposta? 
AK: Na realidade, você tem o seguinte: o Brasil tem uma distorção tributária muito grande porque taxa em excesso o consumo e subtributa o patrimônio e a renda. Consequentemente você faz com que os preços no Brasil de diversos bens fiquem majorados em torno de 50%. Então uma pessoa vai comprar um bem, ela está pagando o valor sem os impostos mais 50% de impostos ligados ao consumo. Quando você tem uma tributação mais equilibrada, como nos países desenvolvidos, essa tributação sobre o consumo não excede 30%. Então você tem bens a preços melhores para o consumo da população. Quando você tem imposto sobre grandes fortunas entrando no compto tributário, você permite aliviar uma parte dessa tributação do consumo sem sacrificar a arrecadação pública. E, quando você faz isso, você está tomando medidas pró-crescimento. E medidas pró-crescimento repercutem do ponto de vista fiscal na melhoria da arrecadação e, portanto, na parte mais saudável das finanças públicas.

CC: Na sua opinião, qual deve ser o valor mínimo de patrimônio a ser taxado para que apenas os ricos sejam atingidos? 
AK: Há várias propostas em discussão com relação à tributação. Eu acho que você deve isentar uma parcela da população. Com patrimônios de cerca de um milhão de reais você já tira dessa tributação 95% ou 98% da população brasileira. Então essa tributação vai incidir em 2% ou 5% da população. E, ao estabelecer essa tributação, você não precisa colocar alíquotas elevadas, essas alíquotas podem ficar no nível de 1% no máximo e ter, ainda assim, esse potencial de arrecadação que eu falei, com 100 bilhões de reais/ano.

CC: Além de regulamentar o imposto sobre grandes fortunas, Piketty fala ainda na importância de taxar a herança. O senhor concorda? 
AK: A tributação da herança é além da questão da tributação das grandes fortunas. É prevista na Constituição e é de fato usada no Brasil. Representa em torno de 4% de tributação sobre o valor da herança. No mundo todo essa tributação é acima de 30%. No Brasil é muito baixo e a razão é a mesma que falei: isso [aumento da tributação] não passa nas assembleias legislativas e não passa no Congresso. Essa alíquota de 4% é uma das mais baixos do mundo. Então se você tivesse uma tributação sobre herança no nível internacional, por volta de 30%, você estaria também aliviando impostos sobre consumo e consequentemente melhorando atividade econômica e arrecadação pública.

CC: Quanto o aumento dessa alíquota sobre a herança poderia gerar a mais de arrecadação? Há alguma estimativa?
 
AK: Não tem no momento isso. A tributação sobre herança é conhecida como Imposto sobre Transmissão Causa Mortis, imposto que pertence exclusivamente aos estados e, se você aumentasse, melhoraria arrecadação dos estados. Os estados têm poder, independentemente do governo federal, de mudar esse percentual de 4%, mas nenhum governador tem interesse em fazer isso porque nenhum governador representa os interesses efetivos da população na questão tributária.

CC: Em um debate sobre o assunto, o jurista Ives Gandra se colocou contra o imposto sobre grandes fortunas ao justificar que a medida causaria a fuga de grandes patrimônios para outros países ou paraísos fiscais. O senhor acredita que isso pode acontecer? Como regular para que não haja fuga de patrimônio? 
AK: Eu queria saber que patrimônio que iria para outros países. E se for, que vá. Será bom até que vá. O que interessa é que o grosso do patrimônio fica no nosso País. E os que pensam que vão lucrar com essa questão de sair do País se enganam porque nos outros países o Imposto de Renda não é tão baixo como aqui, com 27,5%, a alíquota mais baixa do mundo. Em outros países é 40%, 50%, 60%. Então se alguém pensa que vai para outro país para se dar bem...pode ser que exista alguma ilha no mundo, mas talvez não caiba tanta gente.

CC: Quer dizer que a legislação tributária aqui é tão branda quando se trata de patrimônio e renda que em qualquer País os ricos seriam mais prejudicados?
 
AK: Eu acho que sim. Esse argumento é muito fraco, quase ninguém mais usa ultimamente porque na realidade essa ameaça de que vão sair do País não se concretiza. É muito boa [para os ricos] essa questão tributária. Pessoas que têm mais renda, mais riqueza, são muito bem agasalhas pela legislação do Brasil.

CC: O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que chegou a fazer uma proposta de imposto sobre grandes fortunas em 1989 recuou dessa ideia há algum um tempo ao dizer que o valor estipulado por ele, anos antes, para servir de linha de corte poderia atingir a classe média. O valor, atualizado, era algo em torno de 940 mil reais. Quase o mesmo que o senhor propõe. Esse valor atinge a classe média?

AK: É uma classe média alta. Se você olhar bem a distribuição de renda, é classe média alta e aquilo que falei sobre 95% da população estar fora disso é real. Então acho que o ex-presidente FHC se engana. É normal ele se enganar quando trata de questões de interesse da população.


Foto: divulgação

Fritz Lang e o impeachment




"M, o Vampiro de Dusseldorf" é certamente um dos maiores filmes da história do cinema. Nele, Fritz Lang conta a história de um assassino de crianças que coloca uma cidade em pânico.
A polícia pressiona por todos os lados, mas ele parece inapreensível. Tanta pressão policial, no entanto, acabou por atrapalhar a vida de todos os outros bandidos da cidade. No que eles decidem que o melhor a fazer era procurar o assassino e dar um fim nele.

A cena final é antológica: capturado, o assassino é julgado por um tribunal composto de bandidos travestidos de juízes. Um termina acusando o outro, criando uma situação na qual todos estão errados e todos têm razão.

Bem, é difícil seguir as discussões recentes sobre impeachment sem pensar nesta cena final do filme de Lang: bandidos querendo julgar bandidos para ver se, ao final, tudo volta ao normal e os criminosos travestidos de juízes possam continuar a fazer seus negócios em paz.

Afinal, quem acusa o governo é, em grande parte, uma oposição envolvida até o pescoço no mesmo mar untuoso de lama. O que não poderia ser diferente, já que ela partilha exatamente as mesmas práticas políticas, chega até a usar os mesmos agentes corruptores, embora seja um pouco mais esperta na arte da blindagem e da fala dura.

Contra ela, o governo conclama o povo a defender a Petrobras da sanha de seus destruidores. Não aqueles que corromperam a empresa, mas os que os denunciaram. Parece o pobre vampiro de Dusseldorf acusando seus juízes.

Desde o começo da Nova República, o Brasil afunda periodicamente em mares de lama desta natureza. Este é quase um ciclo natural da política brasileira. Como resultado, alguns são afastados dos holofotes, execrados pela opinião pública, presos por um tempo, perdem seus postos e tudo volta ao mesmo lugar.
A razão não é muito difícil de encontrar: este teatro, esta pantomima miserável é feita para dar a impressão de que o sistema político brasileiro funciona. Ela é a forma de tentar nos fazer crer, ao menos por um momento, que seus processos escusos de financiamento usados por todos, sua partidocracia, sua densidade popular baixa nos processos decisórios de Estado e sua ideia falida de representação podem continuar como estão.

Ela é maneira de dizer que a cidade ficará tranquila se afastarmos alguns bandidos e deixarmos que os velhos bandidos de sempre atuem em paz. Mas melhor seria se julgássemos os velhos e os novos juntos, acusados e acusadores, e déssemos um fim a uma experiência política que termina implorando pela reinvenção da democracia.









 Vladimir Safatle é professor livre-docente do Departamento de filosofia da USP (Universidade de São Paulo). Escreve às terças.

segunda-feira, 2 de março de 2015

O analfabeto midiático

POR CELSO VICENZI





Ele ouve e assimila sem questionar, fala e repete o que ouviu, não participa dos acontecimentos políticos, aliás, abomina a política, mas usa as redes sociais com ganas e ânsias de quem veio para justiçar o mundo. Prega ideias preconceituosas e discriminatórias, e interpreta os fatos com a ingenuidade de quem não sabe quem o manipula. Nas passeatas e na internet, pede liberdade de expressão, mas censura e ataca quem defende bandeiras políticas. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. E que elas – na era da informação instantânea de massa – são muito influenciadas pela manipulação midiática dos fatos. Não vê a pressão de jornalistas e colunistas na mídia impressa, em emissoras de rádio e tevê – que também estão presentes na internet – a anunciar catástrofes diárias na contramão do que apontam as estatísticas mais confiáveis. Avanços significativos são desprezados e pequenos deslizes são tratados como se fossem enormes escândalos. O objetivo é desestabilizar e impedir que políticas públicas de sucesso possam ameaçar os lucros da iniciativa privada. O mesmo tratamento não se aplica a determinados partidos políticos e a corruptos que ajudam a manter a enorme desigualdade social no país.

Questões iguais ou semelhantes são tratadas de forma distinta pela mídia. Aula prática: prestar atenção como a mídia conduz o noticiário sobre o escabroso caso que veio à tona com as informações da alemã Siemens. Não houve nenhuma indignação dos principais colunistas, nenhum editorial contundente. A principal emissora de TV do país calou-se por duas semanas após matéria de capa da revista IstoÉ denunciando o esquema de superfaturar trens e metrôs em 30%.

O analfabeto midiático é tão burro que se orgulha e estufa o peito para dizer que viu/ouviu a informação no Jornal Nacional e leu na Veja, por exemplo. Ele não entende como é produzida cada notícia: como se escolhem as pautas e as fontes, sabendo antecipadamente como cada uma delas vai se pronunciar. Não desconfia que, em muitas tevês, revistas e jornais, a notícia já sai quase pronta da redação, bastando ouvir as pessoas que vão confirmar o que o jornalista, o editor e, principalmente, o “dono da voz” (obrigado, Chico Buarque!) quer como a verdade dos fatos. Para isso as notícias se apoiam, às vezes, em fotos e imagens. Dizem que “uma foto vale mais que mil palavras”. Não é tão simples (Millôr, ironicamente, contra-argumentou: “então diga isto com uma imagem”). Fotos e imagens também são construções, a partir de um determinado olhar. Também as imagens podem ser manipuladas e editadas “ao gosto do freguês”. Há uma infinidade de exemplos. Usaram-se imagens para provar que o Iraque possuía depósitos de armas químicas que nunca foram encontrados. A irresponsabilidade e a falta de independência da mídia norte-americana ajudaram a convencer a opinião pública, e mais uma guerra com milhares de inocentes mortos foi deflagrada.

O analfabeto midiático não percebe que o enfoque pode ser uma escolha construída para chegar a conclusões que seriam diferentes se outras fontes fossem contatadas ou os jornalistas narrassem os fatos de outro ponto de vista. O analfabeto midiático imagina que tudo pode ser compreendido sem o mínimo de esforço intelectual. Não se apoia na filosofia, na sociologia, na história, na antropologia, nas ciências política e econômica – para não estender demais os campos do conhecimento – para compreender minimamente a complexidade dos fatos. Sua mente não absorve tanta informação e ele prefere acreditar em “especialistas” e veículos de comunicação comprometidos com interesses de poderosos grupos políticos e econômicos. Lê pouquíssimo, geralmente “best-sellers” e livros de autoajuda. Tem certeza de que o que lê, ouve e vê é o suficiente, e corresponde à realidade. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e o espoliador das empresas nacionais e multinacionais.”

O analfabeto midiático gosta de criticar os políticos corruptos e não entende que eles são uma extensão do capital, tão necessários para aumentar fortunas e concentrar a renda. Por isso recebem todo o apoio financeiro para serem eleitos. E, depois, contribuem para drenar o dinheiro do Estado para uma parcela da iniciativa privada e para os bolsos de uma elite que se especializou em roubar o dinheiro público. Assim, por vias tortas, só sabe enxergar o político corrupto sem nunca identificar o empresário corruptor, o detentor do grande capital, que aprisiona os governos, com a enorme contribuição da mídia, para adotar políticas que privilegiam os mais ricos e mantenham à margem as populações mais pobres. Em resumo: destroem a democracia.

Para o analfabeto midiático, Brecht teria, ainda, uma última observação a fazer: Nada é impossível de mudar. Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual.

O analfabeto político

O pior analfabeto, é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha
Do aluguel, do sapato e do remédio
Depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que
Se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil,
Que da sua ignorância nasce a prostituta,
O menor abandonado,
O assaltante e o pior de todos os bandidos
Que é o político vigarista,
Pilantra, o corrupto e o espoliador
Das empresas nacionais e multinacionais.


Bertold Brecht



Foto: Aqui