por Cynara Menezes
Entendo que Lula deseje pacificar Dilma com o PMDB para que, afinal,
eles não acabem participando da trama do impeachment. Entendo que a
própria presidenta queira isso. Mas há PMDBs e PMDBs. Não existe mais a
possibilidade de Dilma dialogar com o PMDB que Eduardo Cunha, o
presidente da Câmara, representa. O PMDB dos fundamentalistas
religiosos, dos que querem transformar o País numa teocracia. Esta gente
odeia Dilma, odeia tudo que ela representa. E quer tomar o seu lugar.
A história do PT o empurra para a obrigação de deter a escalada dos
fundamentalistas, cujo alvo principal é a presidência da República. Ou
Dilma e Lula têm a ilusão de que em 2018 terá este PMDB a seu lado
novamente? Em nome da tal governabilidade, o PT dilapidou seu patrimônio
ético e político ao longo dos anos que está no poder. Para agradar
setores à direita, eliminou os “radicais” do partido, quando em muitos
aspectos eles eram o que de melhor o PT tinha. Que falta eles fazem
hoje!
Será que o PT acalenta o sonho de permanecer no poder em 2018? Ou
melhor: será que o PT será reeleito em 2018? Tenho minhas dúvidas. Mas
tanto para permanecer no poder quanto para se preparar para deixá-lo, o
partido deveria começar a fazer o que tem de ser feito. Dar ao Brasil de
presente a entrada no primeiro mundo de fato, onde a civilidade supera a
barbárie. Neste quarto mandato à frente do País, o PT precisa garantir
seu lugar na história, como fez Pepe Mujica no Uruguai e mesmo Barack
Obama nos Estados Unidos. E acredito que Dilma sairá fortalecida se o
fizer. O PT cresce quando confronta.
O contra-ataque no Congresso deveria se basear em quatro projetos basicamente:
1. Imposto sobre grandes fortunas: é
um assunto que conta com o apoio de grande parcela da população. Só é
polêmico, na verdade, para quem possui grandes fortunas.
2. Legalização da maconha para uso medicinal: segundo pesquisa Datafolha de
novembro do ano passado, 56% dos brasileiros se manifestaram contrários
à venda da maconha para uso medicinal. Mas e os outros 44%? Uma boa
campanha não seria capaz de modificar o pensamento de quem se opõe? Se
o próprio ex-presidente FHC, que é da oposição, participa de campanhas a
favor… Este é um tema caro à esquerda brasileira, tão menosprezada pelo
PT nos últimos anos. E o ideal é que fosse um projeto que abarcasse
também o uso e o plantio para consumo próprio, o que elimina o
narcotráfico.
3. Reforma política: um projeto
próprio e avançado, com tudo que o PT sempre quis colocar em pauta. Voto
em lista, financiamento público de campanha e aumento da participação
da mulher. Nada mais perfeito para mostrar quem está mesmo preocupado
com a ética na política.
4. Criminalização da homofobia: pesquisa do Ibope
de setembro do ano passado mostrou que 53% dos brasileiros são contra o
casamento gay, mas 40% são a favor. Trata-se de uma parcela muito
significativa da população que se mostra partidária da tolerância com o
semelhante e que precisa ser atendida em seu desejo de que o País avance
no combate ao preconceito. Sem contar que os cidadãos LGBTs votaram em
Dilma, ela lhes deve isso.
Ao apresentar estes projetos no Congresso, Dilma iria recuperar
imediatamente a simpatia da parcela mais progressista do eleitorado, que
é formadora de opinião e foi importantíssima para sua reeleição. E,
assim como Obama fez, dará um xeque-mate no conservadorismo religioso,
porque é uma dessas ocasiões em que, mesmo se for derrotada, Dilma
ganha. Se perder, o Congresso sairá com uma imagem extremamente
retrógrada não só diante do Brasil como do mundo. A presidenta, ao
contrário, sairá como a mulher que tentou colocar o País no rumo das
nações mais civilizadas do planeta e foi derrotada por políticos
atrasados, dignos de república de bananas.
Aposto que seria uma boa briga e que só faria bem à popularidade da
presidenta. Um antídoto contra o golpismo dos fundamentalistas, que
dificilmente conseguiriam levantar a cabeça de novo. Se, em vez disso, o
PT e Dilma resolverem baixar a cabeça, cedendo cargos e espaço no
governo para o conservadorismo, nada mais farão que dar um tiro no
próprio pé e enterrar o partido de vez. Além de colocar o Brasil no rumo
das trevas.
Ninguém aguenta mais a covardia que o PT está demonstrando no
governo. Afinal, a presidenta tem coração valente ou era só truque de
marketing? Vai para cima deles, Dilma!
(Mais para o final do mandato, a presidenta Dilma deveria apresentar
ao País um bom projeto para a legalização do aborto. Está mais do que na
hora e ela é a pessoa certa para fazê-lo e passar à história. Tenho
certeza disso.)
(Foto: José Cruz/Agência Brasil)
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