Blog I'unitá Brasil

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terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A Defensoria Pública como agente de transformação social


Por Thiago Alves Rodrigues




A outorga de um título de domínio de um imóvel a um cidadão carente de recursos financeiros, muito além de conferir segurança jurídica e promover a pacificação de conflitos fundiários, produz relevantes efeitos econômicos e sociais muitas vezes ignorados, ou mesmo subestimados, por todos nós.

 De acordo com o economista peruano, Hernando de Soto, autor da instigante obra “O mistério do capital” (2001), a regularização dos ativos financeiros das pessoas pobres pode injetar no Terceiro Mundo uma quantia de dinheiro equivalente ao PIB dos Estados Unidos.

 De fato, dentre os efeitos potenciais da simples transmutação do complexo fenômeno da posse em propriedade formal, podemos destacar: a) a concretização do direito fundamental à moradia, com a ampliação do acesso ao sistema financeiro de habitação e ao financiamento imobiliário de um modo geral; b) o acesso de micro e pequenos empresários, bem como de pequenos produtores rurais, a linhas de crédito bancário, públicas e privadas, com juros mais baixos, mediante a possibilidade de oferecimento de garantias reais; c) a valorização dos imóveis e de todo o entorno das áreas regularizadas; d) o estímulo à economia formal e a diminuição da pobreza, com a geração e circulação de riquezas; e) o desestímulo aos empréstimos financeiros concedidos à margem da legalidade (agiotagem); f) a possibilidade de um planejamento urbanístico mais eficiente por parte do município; i) maior eficiência na gestão e arrecadação de tributos por parte da administração pública.

 Diante desse quadro, a Defensoria Pública Estadual tem motivos para se orgulhar de sua silenciosa contribuição para a progressiva transformação do quadro econômico e social dos municípios onde atua.

 A título de exemplo, são mais de quatrocentas ações de usucapião em trâmite nas cinco Varas Cíveis da Comarca de Cachoeiro de Itapemirim, ajuizadas pelo órgão em favor de famílias hipossuficientes, tendo como objeto a declaração de domínio e o registro dos bens imóveis dessas pessoas, a maioria dos quais utilizados como moradia e com área inferior a 250m².

 E, curiosamente, a experiência haurida dessa enxurrada de ações indica que vem crescendo por parte dos assistidos o interesse pelos efeitos periféricos da declaração de domínio, notadamente as oportunidades de acesso ao crédito bancário, fato que reflete o momento favorável por que passa a economia brasileira.

 Mais crédito para comprar a casa própria, para reformar a residência ou para investir em pequenos empreendimentos significa mais dinheiro em circulação na economia local, mais empregos formais e uma espiral de desenvolvimento que, em última análise, é capaz de contribuir de maneira significativa com a redução da pobreza e das desigualdades sociais.

 É por tais razões que hoje o defensor público, mais do que um advogado público, é visto como um verdadeiro agente de transformação social, pois sua atuação provoca reflexos mais abrangentes no meio social onde exerce o seu mister.

 Nessa esteira, não seria exagero dizer que a atuação da Defensoria Pública, na atual conjuntura, contribui para a construção das bases jurídicas necessárias ao desenvolvimento do país, sobretudo quando sabemos que esse desenvolvimento tem como ator de destaque uma vasta classe social emergente, mas que ainda dependente de serviços públicos gratuitos oferecidos pela instituição.







Thiago Alves Rodrigues é Defensor Público no Estado do Espírito Santo

sábado, 25 de janeiro de 2014

Do que interessa

  Um país que trata mal suas crianças adoece a alma dos seus jovens, que se tornam adultos infelizes com a quase certeza de que serão mal tratados na velhice, e que se tiverem a sorte de não ser verão, com os olhos de um coração triste, outros serem.

 


Esta é a triste constatação que este adulto que foi uma criança que teve a sorte de ser criada com amor chega, ou que reafirma, ao fim de uma semana em que duas revoltantes situações vieram a público na Grande Vitória.

A primeira foi o episódio em que uma garota de dois anos caiu, ou foi jogada por outro garoto de onze anos de uma janela/sacada de um abrigo da prefeitura do município de Cariacica.

O abrigo em questão recebe crianças abandonadas ou que tiveram a guarda retirada dos pais por motivos diversos, e "funciona" num imóvel precário onde, de acordo com relatos feitos com ênfase por vizinhos, as crianças sofrem maus tratos dos funcionários que deveriam zelar pelo bem estar das mesmas crianças pra amenizar uma situação triste imposta pelo destino.

Neste caso do abrigo uma pergunta, entre as muitas que permeiam meu pensar, tem sido contumaz.

Onde está a força da voz da parte da imprensa e dos alienados por ela que gritam por redução de maioridade penal quando um menor entra em conflito com a lei ?

Pois bem. Acredito que esta força esteja por aí; é uma pena que esta força quase nunca seja usada para tirar de sob pesos malditos corações - realmente - aflitos.

A segunda situação foi a visita de uma comissão criada pela Ordem dos Advogados do Brasil seccional Espírito Santo (OAB-ES) à Unidade de Atendimento do Deficiente (UNAED), instituição administrada pelo Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (IASES) e a constatação de que seres humanos são tratados sem nenhuma dignidade, o que já havia sido constatado em outra visita feita em 2009.

As irregularidades encontradas na UNAED são inadmissíveis que ocorram por uma hora e vem ocorrendo por anos sem que o poder público tome uma atitude que ponha fim ao sofrimento dessas pessoas.

Não é nada complicado para o poder público criar uma comissão eficiente para fiscalizar instituições que cuidam de pessoas e garantir que elas funcionem com eficiência. Mas pra que isso aconteça a cobrança também deve ser eficiente por parte da população.



Por Afonso Hipólito

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Boa vontade é remédio de fácil ingestão que cura até doenças que parecem incuráveis


Por Afonso Hipólito



Quando situações como a que o estado do Maranhão tem vivido - e que é a realidade de quase todo o país - aparecem na imprensa muitas e variadas opiniões são exprimidas, a maioria, infelizmente, sem uma reflexão sobre como as coisas foram parar em tão extremo ponto.

Muitos vociferam que presídios devem ser ruins mesmo, que preso tem mais é que ficar amontoado um sobre o outro e blá, blá, blá...

O que eu penso é que o sistema penitenciário deve ser eficiente para impedir que quadrilhas sejam formadas ou/e fortalecidas dentro dos presídios e pra isso é crucial desamontoar os presos separando-os de dois em dois e em casos específicos de um em um numa estrutura que facilite uma vigilância com melhores resultados no sentido de impedir, por exemplo, que ordens para que atentados sejam cometidos do lado de fora sejam dadas do lado de dentro através de mecanismos que a vulnerabilidade atual dos presídios permite.

O sistema penitenciário deve ser decentemente constitucional no que tange ao processo de ressocialização, com medidas efetivas, como estudo e trabalho para os condenados durante todo o cumprimento de suas penas, medidas tais que não se deve encarar como oportunidades, mas como deveres. Ao fim desse processo - quase certamente - nem todos que por ele passaram serão recuperados como cidadãos - de fato - mas, com toda certeza, um número bem maior do que o que hoje o atual ineficiente sistema que temos recupera.

Devemos entender é que um sistema penitenciário eficiente e decentemente constitucional não é para afagar a face de delinquentes que tantos acham que querem somente quentes porque acham que isso seria a solução daquilo que quase sempre nem sabem o que é, mas para fomentar a busca - que deve ser contumaz - pelo direito de se viver de forma digna. E este processo, se concretizado, beneficiará justamente muito mais os que não incorrem em ilegalidades e estão do lado de fora dos presídios do que os que infringiram leis e lá dentro estão.

Como se pode ver, com um pouco de reflexão se entende que se o poder público cumprisse o seu dever de forma integral, como deve ser, os amanhãs não seriam tão temerosamente previsíveis como tem sido em contextos que envolvem a questão aqui abordada.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Razões para NÃO reduzir a maioridade penal



Na última semana uma tragédia abalou todos os funcionários e alunos da Faculdade Cásper Líbero, onde estou terminando o curso de jornalismo. O aluno de Rádio e TV Victor Hugo Deppman, de 19 anos, foi morto por um assaltante na frente do prédio onde morava, na noite da terça-feira (9). O crime chocou não só pela banalização da vida – Victor Hugo entregou o celular ao criminoso e não reagiu –, mas também pela constatação de que a tragédia poderia ter acontecido com qualquer outro estudante da faculdade.

Esse novo capítulo da violência diária em São Paulo ganhou atenção especial da mídia por um detalhe: o criminoso estava a três dias de completar 18 anos. Ou seja, cometeu o latrocínio (roubo seguido de morte) enquanto adolescente e foi encaminhado à Fundação Casa.

Óbvio que a primeira reação é de indignação; acho válida toda a revolta da população, em especial da família do garoto, mas não podemos deixar que a emoção nos leve a atitudes irresponsáveis. Sempre que um adolescente se envolve em um crime bárbaro, boa parte da população levanta a voz para exigir a redução da maioridade penal. Alguns vão adiante e chegam a questionar se não seria hora do Estado se igualar ao criminoso e implantar a pena de morte no país. Foi o que fez de forma inconsequente o filósofo Renato Janine Ribeiro, em artigo na Folha de S. Paulo, por ocasião do assassinato brutal do menino João Hélio em 2007.

Além de obviamente não termos mais espaço para a Lei de Talião no século XXI, legislar com base na emoção nada mais atende do que a um sentimento de vingança. Não resolve (nem ameniza) o problema da violência urbana.

O que chama a atenção é maneira como a grande mídia cobre essas tragédias. A maioria das matérias que vemos nos veículos tradicionais só reforçam uma característica do Brasil que eles mesmo criticam: somos o país do imediatismo. A cada crime brutal cometido por um adolescente, discutimos os efeitos da violência, mas não as suas causas. Discutimos como reprimir, não como prevenir. É uma tática populista que desvia o foco das reais causas do problema.

Abaixo exponho a lista de motivos pelos quais sou contra a redução da maioridade penal:


As leis não podem se basear na exceção


A maneira como a grande mídia cobre estes crimes bárbaros cometidos por adolescentes nos dá a (falsa) impressão de que eles estão entre os mais frequentes. É justamente o inverso. O relatório de 2007 da Unicef“Porque dizer não à redução da idade penal” mostra que crimes de homicídio são exceção:

“Dos crimes praticados por adolescentes, utilizando informações de um levantamento realizado pelo ILANUD [Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente] na capital de São Paulo durante os anos de 2000 a 2001, com 2100 adolescentes acusados da autoria de atos infracionais, observa-se que a maioria se caracteriza como crimes contra o patrimônio. Furtos, roubos e porte de arma totalizam 58,7% das acusações. Já o homicídio não chegou a representar nem 2% dos atos imputados aos adolescentes, o equivalente a 1,4 % dos casos conforme demonstra o gráfico abaixo.”


E para exibir dados atualizados, dentre os 9.016 internos da Fundação Casa, neste momento apenas 83 infratores cumprem medidas socioeducativas por terem cometido latrocínio (caso que reacendeu o debate sobre a maioridade penal na última semana). Ou seja, menos que 1%.


Redução da maioridade penal não diminui a violência. O debate está focado nos efeitos, não nas causas da violência


Como já foi dito, a primeira reação de alguns setores da sociedade sempre que um adolescente comete um crime grave é gritar pela redução da maioridade penal. Ou quase isso: dificilmente vemos a mesma reação quando a vítima mora na periferia (nesses casos, a notícia vira apenas uma notinha nas páginas policiais). Mas vamos evitar leituras ideológicas do problema.

A redução da maioridade penal não resolve nem ameniza o problema da violência. “Toda a teoria científica está a demonstrar que ela [a redução] não representa benefícios em termos de segurança para a população”,afirmou em fevereiro Marcos Vinícius Furtado, presidente da OAB. A discussão em torno na maioridade penal só desvia o foco das verdadeiras causas da violência.

Instituto Não Violência é bem enfático quanto a isso: “As pesquisas realizadas nas áreas social e educacional apontam que no Brasil a violência está profundamente ligada a questões como: desigualdade social (diferente de pobreza!), exclusão socialimpunidade (as leis existentes não são cumpridas, independentemente de serem “leves” ou “pesadas”), falhas na educação familiar e/ou escolar principalmente no que diz respeito à chamada educação em valores ou comportamento ético, e, finalmente, certos processos culturais exacerbados em nossa sociedade como individualismo, consumismo e cultura do prazer.

No site da Fundação Casa temos acesso a uma pesquisa que revela o perfil dos internos (2006):








Em linhas gerais, o adolescente infrator é de baixa renda, tem muitos irmãos e os pais dificilmente conseguem sustentar e dar a educação ideal a todos (longe disso). Isso sem contar quando o jovem é abandonado pelos pais, quando um deles ou ambos faleceram, quando a criança nem chega a conhecer o pai, entre outras complicações.

Claro que é bom evitar uma posição determinista, a pobreza e a carência afetiva por si só não produzem criminosos. Mas a falta de estrutura familiar, de educação, a exposição maior à violência nas periferias e a falta de políticas públicas para esses jovens os tornam muito mais suscetíveis a cometer pequenos crimes.

Especialistas afirmam que os adolescentes começam com delitos leves, como furtos, e depois vão subindo “degraus” na escada do crime. De acordo com Ariel de Castro Alves, ex secretário-geral do Conselho Estadual da Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), muitos dos adolescentes que chegam ao latrocínio têm dívidas com traficantes e estão ameaçados de morte, e isso os estimula a roubar.


Vale aqui lembrar a falência da Fundação Casa, que em vez de recuperar os jovens, acaba incentivando os internos a subir esses degraus do crime. Para entender melhor sua realidade, recomendo a leitura da matéria“De Febem a Fundação Casa” da Revista Fórum. Nela temos o relato do pedagogo Carlos (nome fictício), que sofreu ameaças frequentes por contestar os atos abusivos da direção: “A Fundação Casa nasceu para dar errado. Eles saem de lá com mais ódio, achando que as pessoas são todas ruins e que não há como mudar isso. São desrespeitados como seres humanos, são tratados como lixo. E isso faz com que eles pensem que não podem mudar.”
Atuante na Fundação há onze anos, Carlos conta que os atos de violência contra os adolescentes são cotidianos e descarados, apoiados inclusive pelo diretor, que também “bate na cara dos meninos”. Essa bola de neve de violência só poderia resultar em crimes cada vez mais graves cometidos pelos garotos.

A redução da maioridade penal tornaria mais caótico o já falido sistema carcerário brasileiro e aumentaria o número de reincidentes



Dados objetivos : Temos no Brasil mais de 527 mil presos e um déficit de pelo menos 181 mil vagas. Não precisamos nos aprofundar sobre a superlotação e as condições desumanas das cadeias brasileiras, é óbvio que um sistema desses é incapaz de recuperar alguém.
A inclusão de adolescentes infratores nesse sistema não só tornaria mais caótico o sistema carcerário como tende a aumentar o número de reincidentes. Para o advogado Walter  Cenevivacolunista da Folha, a medida pode tornar os jovens criminosos ainda mais perigosos: “Colocar menores infracionais na prisão será uma forma de aumentar o número de criminosos reincidentes, com prejuízo para a sociedade. A redução da maioridade penal é um erro.”

A Unicef também destaca os problemas que os EUA enfrentam por colocar adolescentes e adultos nos mesmos presídios. “Conforme publicado este ano [2007] no Jornal New York Times, a experiência de aplicação das penas previstas para adultos para adolescentes nos Estados Unidos foi mal sucedida resultando em agravamento da violência. Foi demonstrado que os adolescentes que cumpriram penas em penitenciárias, voltaram a delinqüir e de forma ainda mais violenta, inclusive se comparados com aqueles que foram submetidos à Justiça Especial da Infância e Juventude.”
O texto em questão foi publicado no New York Times em 11 de maio de 2007 e está disponível na íntegra na página 34 deste PDF da Unicef.

Ao contrário do que é veiculado, reduzir a maioridade penal não é a tendência do movimento internacional

Tenho visto muitos textos afirmando que o Brasil é um dos raros países que estipulou a maioridade penal em 18 anos. Tulio Kahn, doutor em ciência política pela USP, contesta esses dados. “O argumento da universalidade da punição legal aos menores de 18 anos, além de precário como justificativa, é empiricamente falso. Dados da ONU, que realiza a cada quatro anos a pesquisa Crime Trends(Tendências do Crime), revelam que são minoria os países que definem o adulto como pessoa menor de 18 anos e que a maior parte destes é composta por países que não asseguram os direitos básicos da cidadania aos seus jovens.”
Ainda segundo a Unicef “de 53 países, sem contar o Brasil, temos que 42 deles (79%) adotam a maioridade penal aos 18 anos ou mais. Esta fixação majoritária decorre das recomendações internacionais que sugerem a existência de um sistema de justiça especializado para julgar, processar e responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos. Em outras palavras, no mundo todo a tendência é a implantação de legislações e justiças especializadas para os menores de 18 anos, como é o caso brasileiro.”
O que pode estar acontecendo na grande mídia é uma confusão conceitual pelo fato de muitos países usarem a expressão penal para tratar da responsabilidade especial que incide sobre os adolescentes até os 18 anos. “Países como Alemanha, Espanha e França possuem idades de inicio da responsabilidade penal juvenil aos 14, 12 e 13 anos. No caso brasileiro tem inicio a mesma responsabilidade aos 12 anos de idade. A diferença é que no Direito Brasileiro, nem a Constituição Federal nem o ECA mencionam a expressão penal para designar a responsabilidade que se atribui aos adolescentes a partir dos 12 anos de idade”.
Confiram aqui a tabela comparativa entre diferentes países ao redor do mundo. Alguns países vêm seguido o caminho contrário do que a grande mídia divulga e aumentado a maioridade penal. “A Alemanha restabeleceu a maioridade para 18 anos e o Japão aumentou para 20 anos. A tendência é combater com medidas socioeducativas. Estudos apontam que os crimes praticados por crianças e adolescentes, no Brasil, não passariam de 15%. Há uma falsa impressão de que esses jovens ficam impunes, o que não é verdade, pois eles respondem ao ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente)”, argumenta Márcio Widal, secretário da Comissão dos Advogados Criminalistas da OAB.
Também não vejo os grandes jornais divulgarem que muitos estados americanos estão aumentando a maioridade penal.
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Há ainda diversos argumentos contra a redução da maioridade penal, mas o texto já se estendeu muito e vamos focar em mais dois. A medida é inconstitucional; a questão da maioridade faz parte das cláusulas pétreas da Constituição de 1988, que não podem ser modificadas pelo Congresso Nacional (saiba mais sobre as cláusulas pétreas da CF aqui). Seria necessária uma nova Assembleia Constituinte para alterar a questão.
“São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial” (Artigo 228 da Constituição Federal). Ou seja, todas as pessoas abaixo dos 18 anos devem ser julgadas, processadas e responsabilizadas com base em uma legislação especial, diferenciada dos adultos.
Há ainda o clássico argumento de que o crime organizado utiliza os menores de idade para “puxar o gatilho” e pegar penas reduzidas. Se aprovada a redução da maioridade penal, os jovens seriam recrutados cada vez mais cedo. Se baixarmos para 16 anos, quem vai disparar a arma é o jovem de 15. Se baixarmos para 14, quem vai matar será o garoto de 13. Estaríamos produzindo assassinos cada vez mais jovens. Além disso, “o que inibe o criminoso não é o tamanho da pena e sim a certeza de punição”, diz o advogado Ariel de Castro Neves.  “No Brasil existe a certeza de impunidade já que apenas 8% dos homicídios são esclarecidos. Precisamos de reestruturação das polícias brasileiras e melhoria na atuação e estruturação do Judiciário.”
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Concluindo…

Reforçando, tudo o que foi discutido até aqui foi para mostrar o problema de tratar essa questão com imediatismo, impulsividade. Os debates estão sendo feitos quase sempre em cima dos efeitos da violência, não de suas causas, desviando o foco das reais origens do problema.
Que tal nos mobilizarmos para cobrar uma profunda reforma na Fundação Casa, de forma que ela cumpra minimamente seus objetivos? Ou para cobrar outra profunda reforma no sistema carcerário brasileiro, que possui 40% de presos provisórios? Será que todos deviam estar lá mesmo?
E melhor ainda: que tal nos mobilizarmos para que o Governo invista pesado na prevenção da criminalidade, como escolas de tempo integral, atividades de lazer e cultura? Estudos mostram que quanto mais as crianças são inseridas nessas políticas públicas, menores as chances de serem recrutadas pelo mundo das drogas e pelo crime organizado.
“Quando o Estado exclui, o crime inclui”, afirma Castro Alves. “Se o jovem procura trabalho no comércio e não consegue, vaga na escola ou num curso profissionalizante e não consegue, na boca de fumo ele vai ser incluído.”
Na teoria o ECA é uma ótima ferramenta para prevenir a criminalidade. Mas há um a
bismo entre a teoria e a prática do ECA: a falta de políticas públicas para a juventude, a falta de estrutura e os abusos na Fundação Casa acabam produzindo o efeito contrário do desejado. Mesmo assim, a reincidência no sistema de internação dos adolescentes é de aproximadamente 30%. No sistema prisional comum é de 60%, segundo o Ministério da Justiça.


No fim das contas, suspeito que boa parte da sociedade não quer recuperar os jovens infratores. Muitos gostariam mesmo é de fazer justiça com as próprias mãos ou que o Estado aplicasse a pena de morte, como sugeriu o filósofo Janine Ribeiro no calor da emoção. Mas já que isso não é possível, então “que apodreça na cadeia junto com os adultos”.
Por causa de fatos isolados, como a tragédia do menino João Hélio e do estudante Victor Hugo, cobram do governo a redução da maioridade penal, uma atitude impulsiva e irresponsável que iria piorar ainda mais a questão da violência no Brasil. A questão é tentar reduzir a violência ou atender a um desejo coletivo de vingança?

quarta-feira, 6 de março de 2013

Mais uma vez a bancada evangélica em Brasília se aproveita - muito bem - da vantagem numérica para impor mais uma humilhação ao governo e atravancar o progresso

Por JEAN WYLLYS , 38 , deputado federal pelo PSOL - RJ




Acontece que o deputado Marco Feliciano é um inimigo público e declarado de minorias estigmatizadas e tem um discurso público que estimula a violação da dignidade humana desses grupos.

 Como pode presidir uma comissão de direitos humanos e minorias um deputado que disse que o problema da África negra é "espiritual" porque "os africanos descendem de um ancestral amaldiçoado por Noé", revivendo uma interpretação distorcida e racista da Bíblia, que já foi usada no passado para justificar a escravidão dos negros? Como pode presidir uma comissão de direitos humanos e minorias um deputado que se referiu à Aids como "o câncer gay"?

Um deputado que defende um projeto de lei para obrigar o Conselho Federal de Psicologia a aceitar supostas "terapias de reversão da homossexualidade" anticientíficas e baseadas em preconceitos. Um deputado que quer criminalizar o povo de terreiro e enviar pais e mães de santo à cadeia por rituais religiosos que estão presentes nos mesmos capítulos da Bíblia que ele usa para injuriar os homossexuais? Ele lê a Bíblia com um olho só. Um deputado que apresentou um projeto para anular diversas (boas) decisões do Supremo Tribunal Federal, entre elas a sentença que reconhece as uniões homoafetivas como entidades familiares.

 Na verdade, para ser justo, o acordo realizado para dar a presidência da CDHM ao PSC, com ou sem Marco Feliciano, já era um grave problema. Trata-se de um partido que fez campanha definindo a família de uma maneira que exclui não só gays e lésbicas, como também as famílias monoparentais, as com filhos adotivos e tantas outras. Trata-se de um partido que defende posições fundamentalistas que vão contra os direitos de muitas das minorias que essa comissão deve proteger.

Eu me formei num cristianismo que acolhe os diferentes, respeitando sua dignidade. Eu me apaixonei na juventude por esse cristianismo que deu origem à Teologia da Libertação, que participou da luta contra a ditadura e que nos deu grandes referências.

 O PSC, lamentavelmente, não tem nada a ver com isso. E Marco Feliciano menos ainda! Que ele seja o novo presidente da comissão é uma contradição: é como colocar à frente das políticas contra a violência de gênero um cara que bate na mulher.

 É isso que milhares de brasileiras e brasileiros estão sentido nesse momento: que a Câmara bateu neles. Em nós --confesso que eu também senti. Às vezes, me pergunto o que estou fazendo aqui. Mas depois vejo a mobilização de milhares de pessoas para impedir essa loucura e penso: é isso que estou fazendo, tentando representar aqueles que, como eu, sempre receberam mais insultos e porradas que direitos e estima! Saibam que não estão sozinhos! Luta que segue!

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Maioridade Penal

Por doutor José Nazar




Hoje , vou me permitir trazer a público o que desperta angústia no momento : encontro - me inteiramente perdido no que diz respeito à lei regente da maioridade penal . Na minha visão , a vida errante do menor infrator é raiz do problema no que diz respeito às dificuldades que pairam em torno de uma inclusão social .

A sociedade , como um todo , deve se responsabilizar e não se enganar , acreditando que esse distúrbio social é tão somente problema das autoridades . Sua participação pode levar , sim , as autoridades a se inquietarem um pouco mais , no sentido de cuidar melhor , e com firmeza , dos meninos e das meninas que vivem sob o domínio do medo , no abismo de um abandono social .

Você , como brasileiro , de alguma maneira sofre os efeitos desse mal - estar . Por mais que negue , é tocado de perto pelas agruras insanas por que passam esses menores , pelo que eles próprios são levados  a transgredir como uma maneira de se protegerem de um desamparo radical  .

Diga , você consegue se questionar , procurar entender o que se passa aí , nessa repetição de incidentes desastrosos ? Sim , vamos iniciar um debate , sair dessa comodidade doentia , parar de jogar a culpa nas autoridades e perguntar : o que leva alguns menores a cometer delitos e assassinatos ?

É necessária uma implicação de todos , sacudir a nação sobre esse problema , porque a partir dele muitas outras coisas serão debatidas . O problema do menor infrator está se institucionalizando , e isso não pode ser amputado da nossa vida social , faz parte da vida em sociedade , como alicerce de um processo civilizatório .

A história tem nos mostrado : punições , prisões , alijamento , isso não resolve . É necessário cuidar , e com seriedade , dos menores , e não somente punir . Punição , sim , a partir de cuidados sensatos e coerentes . O que esses menores necessitam é de uma adoção mais convincente da sociedade . Insisto , o império de uma lei que tão somente pune não resolve . Cuidar , nada mais que isso !

Penso , a cada momento , uma coisa diferente . Acreditei que se reduzíssemos para 16 , 14 , 12 anos a idade da maioridade penal , tudo estaria resolvido . E o mais grave , se não interessante  , é que a maioria da população brasileira pensa igual : " a dificuldade de se resolver o problema do menor infrator está na idade limitada em 18 anos " .

Na verdade encontramos o bode expiatório , basta reduzir e o problema estará resolvido . Acreditava - embora , eu mesmo deslizasse para lá e para cá sem uma constância de opinião - , sentia - me aliviado na medida em que encontrava - me conforme o pensamento comum , esse que não quer se incomodar com nada , não quer enxergar o núcleo da questão .

Li , reli , trabalhei trabalhei algumas vezes o Estatuto da Criança e do Adolescente . Você já leu o que está escrito ali ? Conversei com jovens e eles me deram o testemunho de que nada sabem sobre o assunto .

Dialoguei com estudantes de direito e minha admiração tornou - se maior : para algumas faculdades o assunto faz parte das matérias " eletivas " . Perguntei a alguns advogados , olhando olho no olho , nunca leream o Estatuto .

Senhoras e senhores  , o Estatuto da Criança e do Adolescente é a verdadeira obra- prima no mundo das leis que regem a ordem pública do nosso país , conseguiram fazer algo único : quem o fez estava ali de corpo e alma . Mas , se ele é tão bom assim , por que não funciona ? E mais , o estatuto é o culpado de tudo ? E a implicação do menor que cometeu o crime , onde fica ?

Mas , então , onde reside o problema ? Primeiro , o estatuto na realidade nunca foi verdadeiramente implementado . Quase nada , muito pouco , pois ele toca de perto na antecipação dos problemas .

Segundo , não existe vontade , tanto por parte das autoridades , quanto da sociedade , de olhar de frente essa questão . Parece , e isso não é um delírio da minha cabeça , que todos nós , brasileiros , necessitamos manter viva essa sombra espessa de um gozo mau que esses pobres meninos encarnam .

Pesquisei , troquei ideias com especialistas e , com uma certa humildade  , apresentarei uma proposta mais corente acerca do que deve ser mudado no Estatuto da Criança e do Adolescente , esperando retornos .





Escrito por doutor José Nazar e publicado no jornal A Tribuna de Vitória ( ES ) em 24 de fevereiro do ano de 2013           

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

' Fessor , xaubanhêro ? '

Por Afonso Hipólito



Semana passada estive num congresso promovido por uma instituição de ensino em parceria com duas fundações , todas ligadas ao setor industrial .

Sentei - me para assistir a abertura bem próximo a um grupo de professores de uma cidade do norte do Espírito Santo .

Dois jovens apresentaram um diretor de uma das fundações envolvidas e uma diretora da instituição de ensino . O diretor foi sucinto em suas boas vindas aos presentes , já a diretora se estendeu um pouco , cometendo deslizes , como chamar a atenção dos professores para que tenham mais traquejo com " alunos perturbados " .

Após as palavras da equivocada diretora , ou , das palavras equivocadas da diretora , um artista declamou palavras atribuídas a William Shakespeare  durante uma performance .

No decorrer das apresentações , das boas vindas e da performance do artista , o que se viu foi a maioria dos presentes mexendo em celular , falando ao aparelho , conversando uns com os outros , enfim , desrespeitando a organização do evento e , principalmente , infelizmente , a própria classe , que apesar - e além - deles tem profissionais que buscam conhecimento porque entendem que , conhecimento adquirido culmina em bom desempenho das funções , o que reverbera em melhor remuneração ou , na pior das hipóteses , na digna situação de ter o real direito de reivindicar melhorias .

O primeiro palestrante ( Hamilton Werneck ) foi apresentado  e começou sua fala , inicialmente com a tenção dos presentes e uma esperança de que a ordem seria mantida , ledo engano . A falta de respeito voltou , com gente falando num quase gritar ao maldito celular , gente saindo alegando " necessidade " de fumar e outros absurdos .

Em meio a primeira palestra um vídeo  foi exibido sem apresentações e o silêncio tomou conta da platéia . O " homem " bradava no vídeo e todos estáticos , atentos . Ao fim , aplausos , aplausos , aplausos e mais aplausos . Cessadas as ovações o palestrante disse que não entendia a razão de se aplaudir os devaneios dito no vídeo e continuou sua palestra para a platéia desatenta , composta , como penso já ter dado a entender , quase por completo , por " educadores " .

" Ensinar é uma caridade " , logo , o educador é um caridoso . Mas não podemos esquecer que a caridade de ensinar é um ato que não depende só de querer , depende do saber , que depende de disposição para aprender , porque só ensina quem tem o que ensinar , coisas boas ou ruins . E quem não se interessa por coisas boas e tem a função de ensinar ensina o quê ?